From Indigenous Peoples in Brazil

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Uma morte por semana

21/06/2016

Fonte: O Globo, Sociedade, p. 23



Uma morte por semana
Brasil é o país com maior número de ambientalistas assassinados, diz relatório

Renato Grandelle

Relatório da ONG Global Witness mostra que, em 2015, 50 ambientalistas foram assassinados no Brasil, o primeiro no ranking. A cada semana um ambientalista é morto no Brasil. O país é o mais "sangrento" do mundo para quem defende suas terras contra madeireiros, extrativistas e outros invasores de unidades de conservação. No ano passado, foram registrados 50 assassinatos no território nacional, segundo o relatório "Em terreno perigoso", divulgado ontem pela ONG Global Witness. Em todo o planeta, 185 pessoas perderam a vida - um aumento de 59% em relação aos índices registrados em 2014.
No documento, a ONG indica assassinatos em 16 países. No segundo lugar do ranking está Filipinas, com 33 mortos em 2015, e em terceiro a Colômbia, com 26 casos. As principais causas para os atentados contra ambientalistas estão ligadas à mineração, agroindústria, corte ilegal de árvores e projetos de hidrelétricas.
- Com a contínua demanda por minerais, madeira e óleo de palma, governos, empresas e grupos criminosos procuram terras e ignoram a população cuja subsistência depende dos recursos destas regiões - denuncia Billy Kyte, gerente de campanhas da Global Witness. - Muitos assassinatos não foram documentados. O poder público deve intervir para interromper esta espiral de violência.
Os povos indígenas são os mais vulneráveis devido ao isolamento geográfico e à contestação de seu direito sobre a terra ocupada. Quase 40% dos assassinatos contabilizados em 2015 foram de indígenas.
Embora a iminência dos ataques seja frequentemente conhecida, estas populações continuam desprotegidas. De acordo com o Greenpeace, fazendeiros e madeireiros ameaçam invadir no próximo fim de semana a terra indígena do Alto Turiaçu, no Maranhão, uma das últimas áreas de floresta protegida na Amazônia Oriental. Desde 2008, cinco líderes do povo kaapor, que ocupa a região, foram assassinados. O relatório da Global Witness revela que 80% da madeira comercializada no país têm origem ilegal. Grande parte é vendida depois para os Estados Unidos, China e países da União Europeia.
Para Kyte, não haveria tantas mortes - e, consequentemente, impunidade - se o consumidor soubesse a origem dos produtos.
- As empresas devem cortar vínculos com os projetos que pisoteiam os direitos das comunidades nativas - reivindica. - As mudanças climáticas e o crescimento populacional provocarão o aumento da procura por terra e recursos naturais. Se não houver projetos para conter este processo, o número de mortes observado atualmente logo será multiplicado.
O jornalista Pedro César Batista trocou o Pará por Brasília em 1990, dois anos depois do assassinato de seu irmão por "necessidade de sobrevivência". À época, protestava contra o avanço ilegal da agricultura pela Região Norte.
- Tive 18 amigos assassinados - lembra. - Primeiro os fazendeiros e madeireiros tentam cooptar os ambientalistas para que abandonem a luta por direitos sociais. Oferecem uma série de privilégios, inclusive dinheiro. Quando não conseguem, intimidam e espalham calúnias. A esta altura, já é impossível conseguir um emprego. Por último, matam. As ONGs costumam deslocar seus militantes para evitar uma tragédia.
Batista acredita que o número de ameaças a ativistas bateu níveis recordes nos últimos anos, em boa parte devido ao aumento da perseguição promovida pelo próprio poder público.
- O governo está tomado por pessoas cuja trajetória política é notória pelos movimentos contra ambientalistas - alerta. - Vemos hoje a propagação de uma radicalização ideológica concebida para que a sociedade seja antipática aos ativistas do campo. Somos tratados como um entrave à iniciativa privada e ao desenvolvimento econômico, principalmente em um momento de crise no país. Até a polícia contribui para a criminalização de grupos como os quilombolas.
Um dos casos de maior repercussão no ano passado foi o assassinato de Raimundo Santos Rodrigues, de 57 anos, que integrava o grupo de proteção da Reserva Biológica do Gurupi, no Maranhão. Em agosto, ele e sua mulher foram vítimas de uma emboscada no interior do estado. Os criminosos dispararam tiros de espingarda contra o casal. Apenas ela sobreviveu.

NEGÓCIOS MOVIDOS PELA FORÇA Diretor-executivo da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque assinala que o relatório da Global Witness reflete "uma situação crônica" que mancha há décadas a ocupação do campo.
- É chocante porque somos um país que pretende ser um importante ator global, que se orgulha de reduzir índices de pobreza e desigualdade social, mas que no campo ainda é prisioneiro de um modelo de desenvolvimento incapaz de promover justiça - condena. - O Estado insiste em promover uma ocupação focada na produção econômica sem salvaguardas ao meio ambiente, o que garantiria direitos às populações tradicionais. Não há reforma agrária nem uma demarcação eficiente das terras indígenas.
Segundo Roque, o assassinato de ativistas ambientais é apenas "a ponta do iceberg".
- A cadeia de violência é muito maior - destaca. - É um reflexo de como o governo é incapaz de garantir a proteção das populações do campo. Queremos nos integrar ao capitalismo do século XXI, mas na Amazônia os negócios são movidos pela força, como se ainda estivéssemos no século XIX.

O Globo, 21/06/2016, Sociedade, p. 23

http://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/brasil-o-pais-com-mais-assassinatos-de-ambientalistas-no-mundo-diz-ong-19542977
 

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