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Como trabalhar a COP30 e as urgências climáticas em sala de aula
14/08/2025
Fonte: Nova Escola - https://novaescola.org.br/conteudo/22429/cop30-mudancas-climaticas-sala-de-aula
Como trabalhar a COP30 e as urgências climáticas em sala de aula
Saiba como abordar acordos globais em relação à crise climática com os estudantes de forma prática e contextualizada
Por Ingrid Matuoka
14/08/2025
Talvez você não saiba, mas todos os anos, milhões de toneladas de areia do Saara atravessam o Oceano Atlântico carregadas pelos ventos e se espalham pela América do Norte, o Caribe e a América do Sul. Essa poeira traz nutrientes essenciais para fazer crescer a Floresta Amazônica.
Ali, a evapotranspiração das árvores dá origem aos rios voadores, principais responsáveis pela umidade no Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil e em países vizinhos como Bolívia, Paraguai e Argentina. Essas imensas massas de ar carregadas de vapor d'água têm uma vazão superior à do Rio Amazonas, maior rio do mundo em volume de água, e viajam a três quilômetros de altura da superfície. Essa cadeia interdependente entre África e América do Sul sustenta a vida de populações inteiras, além de faunas, floras e cadeias produtivas do planeta.
Qual a relação entre os rios voadores e a segurança hídrica?
Neste vídeo, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) entrevista o pesquisador Antonio Donato Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), sobre a importância da Amazônia na formação de rios voadores e explica mais sobre o fenômeno.
Em um segundo vídeo, a engenheira Monica Porto e o geólogo Reginaldo Bertolo, ambos da Universidade de São Paulo (USP), detalham a relação entre os rios voadores, o desmatamento, o clima e a segurança hídrica.
Além disso, a Floresta Amazônica desempenha um papel crucial no equilíbrio do clima ao absorver bilhões de toneladas de CO₂ da atmosfera, contribuindo para frear o aquecimento global, e abriga uma das maiores biodiversidades do planeta, com cerca de 10% de todas as espécies conhecidas. Essas razões tornam simbólica e estratégica a escolha da Amazônia como sede da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), marcada para novembro, em Belém (PA).
"Temos a esperança de fazer ecoar entre os que tomam decisões as vozes de povos como os indígenas, quilombolas e ribeirinhos, que mantêm a floresta de pé com seus conhecimentos ancestrais, e das juventudes e de movimentos sociais locais que lutam e resistem. São essas pessoas que precisamos escutar se desejamos tomar providências efetivas sobre a crise climática", defende Lucineide Pinheiro, professora na Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA).
De acordo com um estudo do MapBiomas, os territórios ocupados por comunidades tradicionais estão entre os mais bem preservados do país. As terras indígenas perderam menos de 1% de sua área de vegetação nativa nos últimos 38 anos, enquanto nas áreas privadas a devastação foi de 17%. Já uma análise do Instituto Socioambiental (ISA) mostrou que, entre 2003 e 2022, os quilombos perderam apenas 1,4% de florestas, 82% a menos que o entorno.
O que são e como funcionam as COPs
Foi na cidade do Rio de Janeiro, em 1992, durante a Eco-92, ou Cúpula da Terra, que a Conferência das Partes (COP) foi criada como um órgão supremo da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC).
Todos os Estados (Partes) da Convenção são representados na COP e se reúnem para examinar a aplicação da Convenção e de todos os outros instrumentos jurídicos que ela adota, tomando as decisões necessárias para promover a aplicação efetiva destas diretrizes, inclusive por meio de dispositivos institucionais e administrativos.
Um dos principais papeis da COP é examinar as comunicações nacionais e os inventários de emissão submetidos pelas Partes. Com base nessas informações, são avaliados os efeitos das medidas tomadas e os programas desenvolvidos para atingir os principais objetivos da Convenção.
A COP3, de 1997, por exemplo, gerou o Protocolo de Quioto, o primeiro tratado internacional com metas obrigatórias de redução de emissões de gases de efeito estufa por parte dos países desenvolvidos, que historicamente mais contribuíram para o problema. O acordo entrou em vigor em 2005.
Já em 2015, durante a COP21, foi firmado o Acordo de Paris. Principal marco atual, ele visa limitar o aquecimento global a menos de 2oC, preferencialmente a 1,5oC, em relação aos níveis pré-industriais. O ano de 2024 foi o primeiro a registrar um aquecimento global acima de 1,5 oC.
A expectativa é de que a COP30 tenha foco na transição energética justa, economia circular, adaptação à crise climática, financiamento climático de países mais ricos aos mais pobres, justiça climática, proteção da Amazônia e florestas tropicais e combate à desinformação climática.
"A COP30 já está pautando as escolas amazônicas há muito tempo, com discussões sobre a perspectiva histórica desses acordos globais, as metas que foram pactuadas e por quais motivos, quais delas avançaram e de que forma isso foi possível e, principalmente, o que não foi adiante, por parte de quem, e por quais razões", explica Lucineide, que pesquisa Educação Ambiental e Educação na Amazônia em diálogo com as mudanças climáticas.
A especialista explica que isso exige um trabalho interdisciplinar para dar conta do panorama complexo que envolve meio ambiente, política, Geografia, História e muita leitura de textos e dados. "É fundamental que os estudantes entendam por que muitas metas ficaram só no papel e o que efetivamente precisamos fazer para enfrentar a crise climática", destaca.
O que é justiça climática?
Nos anos 1980, Benjamin Chavis, ativista pelos direitos civis que atuou junto a Martin Luther King Jr. nos Estados Unidos, notou que as regiões que mais sofriam com problemas ambientais, como despejos tóxicos, eram ocupadas por populações negras e latinas, enquanto regiões majoritariamente brancas eram bem mais preservadas e verdes.
A esse fenômeno ele deu o nome de racismo ambiental, que evidencia que as populações que já sofrem outras vulnerabilizações estão mais suscetíveis a problemas ambientais. E são também elas que recebem menor apoio financeiro para implementar medidas de resiliência ou para reverter danos.
A justiça climática reconhece esse padrão e luta para que essas populações participem de tomadas de decisões em políticas públicas e sejam privilegiadas em termos de financiamento e ações do Estado.
Em uma escala global, a justiça climática busca responsabilizar os países que mais contribuíram para a degradação ambiental e dela se beneficiaram, em relação aos países que menos contribuíram para o problema e, apesar disso, sofrem mais com os efeitos da crise climática.
A COP30 na escola
Além de explicar o que é a COP30, seu histórico e impactos para as políticas públicas nacionais e internacionais, com destaque para os avanços e retrocessos das metas estipuladas, vale abordar alguns dos temas debatidos durante o fórum, entrelaçados à realidade local, indica Lucineide.
"Os estudantes podem discutir como fazer a renovação energética e os impactos que ela pode causar. Aqui em Santarém, há bastante tempo se discute a questão das hidrelétricas. E, no caso do ano passado, falamos muito da poluição do ar e das queimadas, quando a cidade se tornou a segunda mais poluída do mundo por causa da fumaça. Tem também a questão do garimpo e a violência contra os povos tradicionais e a contaminação dos rios por mercúrio", conta.
LEIA TAMBÉM - 10 ideias para desenvolver a educação climática em sala de aula
Nessa aproximação entre os conceitos e problemas debatidos na COP30 com as questões de seus próprios territórios, os estudantes podem atuar como formuladores e implementadores de projetos e ações de pequena escala.
"Quando os estudantes têm a oportunidade de pesquisar e fazer uma intervenção no local onde vivem, com as pessoas que mais são afetadas, eles passam a compreender a ampliação disso para o país e o espectro global, como propõe a COP", explica Eliane de Siqueira, doutora em Ciências, formadora de professores e produtora de materiais de Educação Ambiental para a rede estadual do Pará.
Ela aconselha que esse trabalho pedagógico seja realizado desde a Educação Infantil. "Quanto antes, maiores as chances de internalizar essas práticas, o pensamento crítico em relação ao meio ambiente e envolver as famílias para que a sustentabilidade se torne rotina na comunidade".
Já em Fortaleza (CE), a professora Cíntia Diógenes planeja abordar com as turmas de 1o a 4o ano do Ensino Fundamental os efeitos que a crise climática tem sobre a caatinga e as políticas que seriam necessárias para enfrentá-los.
Para tanto, ao longo do segundo semestre, a professora realizará uma série de ações interdisciplinares. Para o 1o e 2o ano, ela adaptou o tradicional jogo Banco Imobiliário para o "Banco Verde". Cada jogador começa com 100 moedas verdes. Essas moedas são utilizadas para plantar árvores, principal objetivo do jogo, já que ganha quem criar mais áreas verdes, em vez de casas e prédios como no jogo original.
Conforme caminha pelo tabuleiro, o jogador pode cair em uma casa que exige o sorteio de cartas. Nessa ocasião, pode sair uma carta de "Desafio Climático", como a poluição de rios, desmatamentos e infrações às leis ambientais, que exige o pagamento de moedas verdes para reverter os danos, ou tirar uma carta de "Sorte Sustentável", como investir em energia limpa, criar parques e participar da COP30, o que rende mais moedas. "É uma forma lúdica de entenderem as tomadas de decisões políticas na gestão das cidades", explica Cíntia.
Para os 4o e 5o anos, a professora aconselha realizar uma mini COP30, com eleição de líderes que vão propor e discutir questões ambientais locais e as soluções para colocar em prática. "O fundamental é que eles atuem como cientistas e percebam que podem transformar a casa e a escola deles desde já", diz Cíntia.
Material de apoio: "Nós no clima da mudança"
Para apoiar as turmas dos Anos Finais do Ensino Fundamental na elaboração dos projetos e ações para a Conferência na Escola, foi publicado em abril de 2025 o caderno "Nós no clima da mudança: caminhos de educação e justiça climática" pelo Ministério da Educação (MEC), Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
O material gratuito esmiúça conceitos em torno das mudanças climáticas, os acordos do clima, a necessidade de rever as formas de produção, consumo e relação com a natureza, além de trazer ideias de projetos para engajar as turmas.
Inspirações da Educação indígena
Na Escola Baniwa Eeno Hiepole, que pertence à Terra Indígena Alto Rio Negro, os estudantes vivem os conceitos de justiça climática na prática e se antecipam às tomadas de decisão que possam vir da COP30 porque partem do diagnóstico e das soluções próprias para cultivar o bem-viver na comunidade e na relação com a natureza.
LEIA TAMBÉM - Como integrar a Educação climática ao projeto pedagógico das escolas?
Localizadas no interior do município de São Gabriel da Cachoeira (AM), a escola e a comunidade sofrem impactos cada vez mais intensos da crise climática, com secas prolongadas que tornam inviáveis o transporte e o abastecimento da população, cancelam aulas e matam peixes e outros animais. Depois, a cheia intensa dos rios destrói moradias e prejudica a produção de alimentos. As roças levam de 3 a 5 anos para se recuperarem.
"Vivemos de perto a realidade do que é o impacto das mudanças climáticas, apesar do nosso modo de vida ser pouco industrializado e quase sem emissão de gases de efeito estufa. Isso requer de nós mais planejamento e adaptação de como vamos viver daqui em diante", diz Dzoodzo Baniwa.
Ele é professor na escola Baniwa Eeno Hiepole para as turmas de 6o a 9o ano e pesquisador licenciado em Física e mestre em ensino de Ciências Ambientais. Com suas turmas, estuda a crise climática e as políticas em nível global relacionadas a ela. Mas a maior parte do trabalho se concentra em pesquisar o território e as necessidades locais.
"Quando ocorre algum desastre, fazemos um diagnóstico participativo comunitário para saber como nos afetou. Depois, fazemos um planejamento escolar para construir objetivos educacionais sobre o que os alunos podem estudar para entender o que aconteceu e criar projetos para implementar ações interdisciplinares de mitigação na prática", explica Dzoodzo.
Os estudantes contribuem, por exemplo, na observação, coleta e registro de dados meteorológicos e sobre enchentes e secas, ao relacionar a posição dos astros ao calendário e aos fenômenos naturais, períodos da flora e comportamentos da fauna, além de mapear a biodiversidade da região.
Um dos roteiros de estudo propõe criar mapeamentos de plantas importantes para a alimentação da aldeia. Os alunos entrevistam os sábios da comunidade sobre o manejo da planta e seus principais usos e princípios ativos. Depois, identificam e registram onde ela está presente, quantificam a disponibilidade do recurso no território e comparam com a média de seu consumo pela população.
Em outra oportunidade, os estudantes participaram do estudo e instalação de um sistema de energia fotovoltaico na comunidade, que é abastecida por geradores a diesel e a gasolina por no máximo 4 horas diárias.
Os estudos começaram a partir da pesquisa sobre uma árvore utilizada pelos Baniwa da qual é possível extrair um talo e utilizá-lo como tocha. Depois, passaram a conceitos da Física, como prótons, elétrons, circuitos elétricos e consumo de energia.
"Nos preocupamos com alternativas mais sustentáveis e com a construção de nossa autonomia, para poder gerar a nossa própria energia e manter nosso modo de vida. O que os nossos estudantes precisam entender é como garantir o bem-viver dessa geração e de toda a vida em volta de nós", afirma Dzoodzo.
https://novaescola.org.br/conteudo/22429/cop30-mudancas-climaticas-sala-de-aula
Saiba como abordar acordos globais em relação à crise climática com os estudantes de forma prática e contextualizada
Por Ingrid Matuoka
14/08/2025
Talvez você não saiba, mas todos os anos, milhões de toneladas de areia do Saara atravessam o Oceano Atlântico carregadas pelos ventos e se espalham pela América do Norte, o Caribe e a América do Sul. Essa poeira traz nutrientes essenciais para fazer crescer a Floresta Amazônica.
Ali, a evapotranspiração das árvores dá origem aos rios voadores, principais responsáveis pela umidade no Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil e em países vizinhos como Bolívia, Paraguai e Argentina. Essas imensas massas de ar carregadas de vapor d'água têm uma vazão superior à do Rio Amazonas, maior rio do mundo em volume de água, e viajam a três quilômetros de altura da superfície. Essa cadeia interdependente entre África e América do Sul sustenta a vida de populações inteiras, além de faunas, floras e cadeias produtivas do planeta.
Qual a relação entre os rios voadores e a segurança hídrica?
Neste vídeo, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) entrevista o pesquisador Antonio Donato Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), sobre a importância da Amazônia na formação de rios voadores e explica mais sobre o fenômeno.
Em um segundo vídeo, a engenheira Monica Porto e o geólogo Reginaldo Bertolo, ambos da Universidade de São Paulo (USP), detalham a relação entre os rios voadores, o desmatamento, o clima e a segurança hídrica.
Além disso, a Floresta Amazônica desempenha um papel crucial no equilíbrio do clima ao absorver bilhões de toneladas de CO₂ da atmosfera, contribuindo para frear o aquecimento global, e abriga uma das maiores biodiversidades do planeta, com cerca de 10% de todas as espécies conhecidas. Essas razões tornam simbólica e estratégica a escolha da Amazônia como sede da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), marcada para novembro, em Belém (PA).
"Temos a esperança de fazer ecoar entre os que tomam decisões as vozes de povos como os indígenas, quilombolas e ribeirinhos, que mantêm a floresta de pé com seus conhecimentos ancestrais, e das juventudes e de movimentos sociais locais que lutam e resistem. São essas pessoas que precisamos escutar se desejamos tomar providências efetivas sobre a crise climática", defende Lucineide Pinheiro, professora na Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA).
De acordo com um estudo do MapBiomas, os territórios ocupados por comunidades tradicionais estão entre os mais bem preservados do país. As terras indígenas perderam menos de 1% de sua área de vegetação nativa nos últimos 38 anos, enquanto nas áreas privadas a devastação foi de 17%. Já uma análise do Instituto Socioambiental (ISA) mostrou que, entre 2003 e 2022, os quilombos perderam apenas 1,4% de florestas, 82% a menos que o entorno.
O que são e como funcionam as COPs
Foi na cidade do Rio de Janeiro, em 1992, durante a Eco-92, ou Cúpula da Terra, que a Conferência das Partes (COP) foi criada como um órgão supremo da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC).
Todos os Estados (Partes) da Convenção são representados na COP e se reúnem para examinar a aplicação da Convenção e de todos os outros instrumentos jurídicos que ela adota, tomando as decisões necessárias para promover a aplicação efetiva destas diretrizes, inclusive por meio de dispositivos institucionais e administrativos.
Um dos principais papeis da COP é examinar as comunicações nacionais e os inventários de emissão submetidos pelas Partes. Com base nessas informações, são avaliados os efeitos das medidas tomadas e os programas desenvolvidos para atingir os principais objetivos da Convenção.
A COP3, de 1997, por exemplo, gerou o Protocolo de Quioto, o primeiro tratado internacional com metas obrigatórias de redução de emissões de gases de efeito estufa por parte dos países desenvolvidos, que historicamente mais contribuíram para o problema. O acordo entrou em vigor em 2005.
Já em 2015, durante a COP21, foi firmado o Acordo de Paris. Principal marco atual, ele visa limitar o aquecimento global a menos de 2oC, preferencialmente a 1,5oC, em relação aos níveis pré-industriais. O ano de 2024 foi o primeiro a registrar um aquecimento global acima de 1,5 oC.
A expectativa é de que a COP30 tenha foco na transição energética justa, economia circular, adaptação à crise climática, financiamento climático de países mais ricos aos mais pobres, justiça climática, proteção da Amazônia e florestas tropicais e combate à desinformação climática.
"A COP30 já está pautando as escolas amazônicas há muito tempo, com discussões sobre a perspectiva histórica desses acordos globais, as metas que foram pactuadas e por quais motivos, quais delas avançaram e de que forma isso foi possível e, principalmente, o que não foi adiante, por parte de quem, e por quais razões", explica Lucineide, que pesquisa Educação Ambiental e Educação na Amazônia em diálogo com as mudanças climáticas.
A especialista explica que isso exige um trabalho interdisciplinar para dar conta do panorama complexo que envolve meio ambiente, política, Geografia, História e muita leitura de textos e dados. "É fundamental que os estudantes entendam por que muitas metas ficaram só no papel e o que efetivamente precisamos fazer para enfrentar a crise climática", destaca.
O que é justiça climática?
Nos anos 1980, Benjamin Chavis, ativista pelos direitos civis que atuou junto a Martin Luther King Jr. nos Estados Unidos, notou que as regiões que mais sofriam com problemas ambientais, como despejos tóxicos, eram ocupadas por populações negras e latinas, enquanto regiões majoritariamente brancas eram bem mais preservadas e verdes.
A esse fenômeno ele deu o nome de racismo ambiental, que evidencia que as populações que já sofrem outras vulnerabilizações estão mais suscetíveis a problemas ambientais. E são também elas que recebem menor apoio financeiro para implementar medidas de resiliência ou para reverter danos.
A justiça climática reconhece esse padrão e luta para que essas populações participem de tomadas de decisões em políticas públicas e sejam privilegiadas em termos de financiamento e ações do Estado.
Em uma escala global, a justiça climática busca responsabilizar os países que mais contribuíram para a degradação ambiental e dela se beneficiaram, em relação aos países que menos contribuíram para o problema e, apesar disso, sofrem mais com os efeitos da crise climática.
A COP30 na escola
Além de explicar o que é a COP30, seu histórico e impactos para as políticas públicas nacionais e internacionais, com destaque para os avanços e retrocessos das metas estipuladas, vale abordar alguns dos temas debatidos durante o fórum, entrelaçados à realidade local, indica Lucineide.
"Os estudantes podem discutir como fazer a renovação energética e os impactos que ela pode causar. Aqui em Santarém, há bastante tempo se discute a questão das hidrelétricas. E, no caso do ano passado, falamos muito da poluição do ar e das queimadas, quando a cidade se tornou a segunda mais poluída do mundo por causa da fumaça. Tem também a questão do garimpo e a violência contra os povos tradicionais e a contaminação dos rios por mercúrio", conta.
LEIA TAMBÉM - 10 ideias para desenvolver a educação climática em sala de aula
Nessa aproximação entre os conceitos e problemas debatidos na COP30 com as questões de seus próprios territórios, os estudantes podem atuar como formuladores e implementadores de projetos e ações de pequena escala.
"Quando os estudantes têm a oportunidade de pesquisar e fazer uma intervenção no local onde vivem, com as pessoas que mais são afetadas, eles passam a compreender a ampliação disso para o país e o espectro global, como propõe a COP", explica Eliane de Siqueira, doutora em Ciências, formadora de professores e produtora de materiais de Educação Ambiental para a rede estadual do Pará.
Ela aconselha que esse trabalho pedagógico seja realizado desde a Educação Infantil. "Quanto antes, maiores as chances de internalizar essas práticas, o pensamento crítico em relação ao meio ambiente e envolver as famílias para que a sustentabilidade se torne rotina na comunidade".
Já em Fortaleza (CE), a professora Cíntia Diógenes planeja abordar com as turmas de 1o a 4o ano do Ensino Fundamental os efeitos que a crise climática tem sobre a caatinga e as políticas que seriam necessárias para enfrentá-los.
Para tanto, ao longo do segundo semestre, a professora realizará uma série de ações interdisciplinares. Para o 1o e 2o ano, ela adaptou o tradicional jogo Banco Imobiliário para o "Banco Verde". Cada jogador começa com 100 moedas verdes. Essas moedas são utilizadas para plantar árvores, principal objetivo do jogo, já que ganha quem criar mais áreas verdes, em vez de casas e prédios como no jogo original.
Conforme caminha pelo tabuleiro, o jogador pode cair em uma casa que exige o sorteio de cartas. Nessa ocasião, pode sair uma carta de "Desafio Climático", como a poluição de rios, desmatamentos e infrações às leis ambientais, que exige o pagamento de moedas verdes para reverter os danos, ou tirar uma carta de "Sorte Sustentável", como investir em energia limpa, criar parques e participar da COP30, o que rende mais moedas. "É uma forma lúdica de entenderem as tomadas de decisões políticas na gestão das cidades", explica Cíntia.
Para os 4o e 5o anos, a professora aconselha realizar uma mini COP30, com eleição de líderes que vão propor e discutir questões ambientais locais e as soluções para colocar em prática. "O fundamental é que eles atuem como cientistas e percebam que podem transformar a casa e a escola deles desde já", diz Cíntia.
Material de apoio: "Nós no clima da mudança"
Para apoiar as turmas dos Anos Finais do Ensino Fundamental na elaboração dos projetos e ações para a Conferência na Escola, foi publicado em abril de 2025 o caderno "Nós no clima da mudança: caminhos de educação e justiça climática" pelo Ministério da Educação (MEC), Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
O material gratuito esmiúça conceitos em torno das mudanças climáticas, os acordos do clima, a necessidade de rever as formas de produção, consumo e relação com a natureza, além de trazer ideias de projetos para engajar as turmas.
Inspirações da Educação indígena
Na Escola Baniwa Eeno Hiepole, que pertence à Terra Indígena Alto Rio Negro, os estudantes vivem os conceitos de justiça climática na prática e se antecipam às tomadas de decisão que possam vir da COP30 porque partem do diagnóstico e das soluções próprias para cultivar o bem-viver na comunidade e na relação com a natureza.
LEIA TAMBÉM - Como integrar a Educação climática ao projeto pedagógico das escolas?
Localizadas no interior do município de São Gabriel da Cachoeira (AM), a escola e a comunidade sofrem impactos cada vez mais intensos da crise climática, com secas prolongadas que tornam inviáveis o transporte e o abastecimento da população, cancelam aulas e matam peixes e outros animais. Depois, a cheia intensa dos rios destrói moradias e prejudica a produção de alimentos. As roças levam de 3 a 5 anos para se recuperarem.
"Vivemos de perto a realidade do que é o impacto das mudanças climáticas, apesar do nosso modo de vida ser pouco industrializado e quase sem emissão de gases de efeito estufa. Isso requer de nós mais planejamento e adaptação de como vamos viver daqui em diante", diz Dzoodzo Baniwa.
Ele é professor na escola Baniwa Eeno Hiepole para as turmas de 6o a 9o ano e pesquisador licenciado em Física e mestre em ensino de Ciências Ambientais. Com suas turmas, estuda a crise climática e as políticas em nível global relacionadas a ela. Mas a maior parte do trabalho se concentra em pesquisar o território e as necessidades locais.
"Quando ocorre algum desastre, fazemos um diagnóstico participativo comunitário para saber como nos afetou. Depois, fazemos um planejamento escolar para construir objetivos educacionais sobre o que os alunos podem estudar para entender o que aconteceu e criar projetos para implementar ações interdisciplinares de mitigação na prática", explica Dzoodzo.
Os estudantes contribuem, por exemplo, na observação, coleta e registro de dados meteorológicos e sobre enchentes e secas, ao relacionar a posição dos astros ao calendário e aos fenômenos naturais, períodos da flora e comportamentos da fauna, além de mapear a biodiversidade da região.
Um dos roteiros de estudo propõe criar mapeamentos de plantas importantes para a alimentação da aldeia. Os alunos entrevistam os sábios da comunidade sobre o manejo da planta e seus principais usos e princípios ativos. Depois, identificam e registram onde ela está presente, quantificam a disponibilidade do recurso no território e comparam com a média de seu consumo pela população.
Em outra oportunidade, os estudantes participaram do estudo e instalação de um sistema de energia fotovoltaico na comunidade, que é abastecida por geradores a diesel e a gasolina por no máximo 4 horas diárias.
Os estudos começaram a partir da pesquisa sobre uma árvore utilizada pelos Baniwa da qual é possível extrair um talo e utilizá-lo como tocha. Depois, passaram a conceitos da Física, como prótons, elétrons, circuitos elétricos e consumo de energia.
"Nos preocupamos com alternativas mais sustentáveis e com a construção de nossa autonomia, para poder gerar a nossa própria energia e manter nosso modo de vida. O que os nossos estudantes precisam entender é como garantir o bem-viver dessa geração e de toda a vida em volta de nós", afirma Dzoodzo.
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