From Indigenous Peoples in Brazil
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News
Racismo ambiental: estudo revela negligência em normas climáticas
10/11/2025
Autor: Cristina Serra
Fonte: Amazonia Real - https://amazoniareal.com.br
Belém (PA) - No discurso de abertura da 30ª Conferência da ONU sobre Mudança do Clima, COP 30, em Belém, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que a luta contra a emergência climática é também a luta contra o racismo ambiental. Em vários momentos, Lula se referiu à população afrodescendente, aos povos indígenas e às comunidades tradicionais como as que pagam a maior cota de sacrifício em consequência do aquecimento global.
"O impacto desproporcional da mudança do clima sobre mulheres, afrodescendentes, migrantes e grupos vulneráveis deve ser levado em conta nas políticas de adaptação", afirmou Lula. A cerimônia de abertura teve a participação de três indígenas da etnia Guajajara e Lula falou da importância da demarcação das terras para povos de todo o País. "No Brasil, mais de 13% do território são áreas demarcadas para os povos indígenas. Talvez ainda seja pouco", refletiu. E o presidente sintetizou: "A emergência climática é uma crise de desigualdade".
Apesar de presente em muitos discursos oficiais, como na fala de Lula, a dimensão racial da crise climática ainda é negligenciada nas normas internacionais sobre clima. Uma pesquisa inédita do Centro de Pesquisa Aplicada em Direito e Justiça Racial da Fundação Getúlio Vargas Direito São Paulo, em parceria com o Geledés - Instituto da Mulher Negra, revela que "a normativa climática internacional ignora de forma sistemática a dimensão racial da crise climática". A pesquisa se chama "A raça e o gênero da justiça climática: mapeando desigualdades na normativa global".
O mapeamento foi realizado no período de 1992 (quando foi realizada a Rio 92) até setembro e analisou 115 documentos internacionais, um conjunto de regras formado por leis, princípios e instrumentos jurídicos e políticos que orientam as ações dos países, empresas e sociedade civil no enfrentamento das mudanças climáticas. Ou seja, são as regras que orientam como os países devem responder aos impactos climáticos, de acordo com compromissos nacionais e internacionais.
Reduzida menção a afrodescedentes
Dos 115 documentos, apenas 23% mencionam as populações afrodescendentes. Por outro lado, 95,6% das referências à questão racial constam de documentos sem força legal, ou seja, documentos que os países membros da ONU não têm a obrigatoriedade de aderir. O mapeamento mostrou ainda que a intersecção entre raça e clima aparece em 89 documentos (44,5% do total). "No entanto, apenas dois documentos vinculantes abordam explicitamente essa intersecção, sugerindo que os Estados se referem à justiça racial climática em discursos, mas sem assumir obrigações concretas", destaca o relatório da pesquisa.
Thaynah Gutierrez, assessora de Clima e Racismo Ambiental do Geledés, destaca que o combate ao racismo ambiental é fundamental para se alcançar a justiça climática. Segundo Gutierrez, "o racismo, ao se articular com outras formas de exploração, exclusão e discriminação social, intensifica processos de vulnerabilização socioambiental e aprofunda as violações de direitos humanos". (Foto: Kleber Silva).
Recomendações do estudo FGV-Geledés
A falta de legislação obrigatória específica para o combate ao racismo ambiental contrasta com o tamanho das populações que poderiam ser beneficiadas por esse tipo de normativa. O Brasil abriga a maior população afrodescendente fora do continente africano. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 56% da população brasileira se identifica como negra, ou seja, o somatório de pretos e pardos. São mais de 120 milhões de pessoas.
A população afrodescendente representa cerca de 200 milhões de pessoas em todo o mundo, segundo definição estabelecida pelo Grupo de Trabalho sobre Afrodescendentes das Nações Unidas. Essa é a população formada por descendentes das vítimas do tráfico transatlântico de escravizados e do mar Mediterrâneo - e não contabiliza a população que vive na África.
O estudo faz uma série de recomendações para a COP30. Entre elas, a participação das organizações afrodescendentes em espaços de decisão; que o termo "afrodescendentes" seja incluído nos documentos finais da conferência e que raça e gênero sejam mencionados nos planos de transição justa, ação de gênero e na meta global de adaptação. Pede ainda que sejam destinados recursos de financiamento e reparação para comunidades negras, quilombolas, periféricas e ribeirinhas, diante do duplo impacto do colonialismo e da crise ambiental. Outra sugestão é criar um mecanismo de monitoramento de racismo ambiental no âmbito do órgão da ONU que organiza as conferências climáticas, COPs (UNFCCC, na sigla em inglês, que significa Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas).
Lula critica gasto com guerras
Em seu discurso na abertura da COP30, Lula ressaltou os contrastes entre os cenários geopolíticos da Rio 92 e da COP30. "Há mais de 30 anos, na Cúpula da Terra, os líderes do mundo se reuniram no Rio de Janeiro para debater o desenvolvimento e a proteção do meio ambiente. Naquele momento, o multilateralismo vivia seu ápice. O mundo adentrava a chamada década das conferências, da qual emergiram as grandes bússolas que guiaram a Humanidade ao longo dessas três décadas. Entre elas, estão o conceito de desenvolvimento sustentável e o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, legados vivos da Rio 92", disse o presidente.
Saltando no tempo para hoje, Lula disse que "se os homens que fazem guerra estivessem nesta COP, iriam perceber que é muito mais barato colocar 1,3 trilhão de dólares para a gente acabar com um problema do que colocar 2,7 trilhões de dólares para fazer guerra como fizeram no ano passado".
Nesse ponto, Lula se referiu à dificuldade de os países mais ricos contribuírem para um fundo destinado aos países mais pobres para que possam enfrentar a emergência climática. O financiamento é um dos maiores desafios na COP30. Os recursos para medidas de mitigação e adaptação são cruciais para as populações mais impactadas pelo racismo ambiental. Na semana passada, no primeiro dia da Cúpula de Líderes, Lula lançou oficialmente o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês). Os aportes já chegam a 5,5 bilhões de dólares, mas o objetivo esperado é de de que supere os 125 bilhões de reais.
Segundo Lula, outro desafio que o mundo enfrenta hoje é o negacionismo espalhado pelo algoritmo. "Na era da desinformação, os obscurantistas rejeitam não só as evidências da ciência, mas também os progressos do multilateralismo. Eles controlam algoritmos, semeiam ódio e espalham o medo. Atacam as instituições, a ciência e as universidades. É hora de impor uma nova derrota aos negacionistas", conclamou.
O gargalo do financiamento climático
O embaixador Antônio Côrrea do Lago, presidente eleito da COP30, e Simon Stiell, secretário-executivo da UNFCCC, demonstraram otimismo na primeira coletiva de imprensa, na manhã desta segunda-feira (10), apesar das tensões na aprovação da agenda a ser debatida nesta edição da conferência. Côrrea do Lago destacou o compromisso do Brasil, ressaltando que o atraso na aprovação da agenda, resolvida na noite anterior, permitirá que se aprofunde em questões adicionais.
Já Stiell mencionou que o Acordo de Paris, de 2015, está "dobrando a curva" de aquecimento pela primeira vez, com novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) capazes de reduzir as emissões em 12% até 2035. Mas ele alertou que este progresso "não é nem de perto o suficiente" para evitar os impactos climáticos já sentidos por nações vulneráveis.
Na coletiva, os jornalistas perguntaram mais de uma vez sobre a meta de 1,3 trilhão de dólares. O Embaixador Côrrea do Lago afirmou que, embora o setor privado deva desempenhar um papel crucial para "incorporar o clima na economia" de forma mais ampla, o dinheiro público continua sendo essencial. Ele citou dados preocupantes de que cada dólar investido por bancos de desenvolvimento multilateral alavanca, em média, apenas 60 centavos de dólar de recursos privados. Ou seja, ele entende que é preciso aumentar a confiança e o engajamento do setor privado com projetos climáticos.
Também questionada, a presidência da COP30 elogiou a atuação da China e da Índia por usarem sua escala e tecnologia para baratear elementos essenciais da transição, como painéis solares e veículos elétricos, o que, indiretamente, funciona como cooperação internacional para o Sul Global. (Colaborou Eduardo Nunomura)
https://amazoniareal.com.br/lula-racismo-ambiental/
"O impacto desproporcional da mudança do clima sobre mulheres, afrodescendentes, migrantes e grupos vulneráveis deve ser levado em conta nas políticas de adaptação", afirmou Lula. A cerimônia de abertura teve a participação de três indígenas da etnia Guajajara e Lula falou da importância da demarcação das terras para povos de todo o País. "No Brasil, mais de 13% do território são áreas demarcadas para os povos indígenas. Talvez ainda seja pouco", refletiu. E o presidente sintetizou: "A emergência climática é uma crise de desigualdade".
Apesar de presente em muitos discursos oficiais, como na fala de Lula, a dimensão racial da crise climática ainda é negligenciada nas normas internacionais sobre clima. Uma pesquisa inédita do Centro de Pesquisa Aplicada em Direito e Justiça Racial da Fundação Getúlio Vargas Direito São Paulo, em parceria com o Geledés - Instituto da Mulher Negra, revela que "a normativa climática internacional ignora de forma sistemática a dimensão racial da crise climática". A pesquisa se chama "A raça e o gênero da justiça climática: mapeando desigualdades na normativa global".
O mapeamento foi realizado no período de 1992 (quando foi realizada a Rio 92) até setembro e analisou 115 documentos internacionais, um conjunto de regras formado por leis, princípios e instrumentos jurídicos e políticos que orientam as ações dos países, empresas e sociedade civil no enfrentamento das mudanças climáticas. Ou seja, são as regras que orientam como os países devem responder aos impactos climáticos, de acordo com compromissos nacionais e internacionais.
Reduzida menção a afrodescedentes
Dos 115 documentos, apenas 23% mencionam as populações afrodescendentes. Por outro lado, 95,6% das referências à questão racial constam de documentos sem força legal, ou seja, documentos que os países membros da ONU não têm a obrigatoriedade de aderir. O mapeamento mostrou ainda que a intersecção entre raça e clima aparece em 89 documentos (44,5% do total). "No entanto, apenas dois documentos vinculantes abordam explicitamente essa intersecção, sugerindo que os Estados se referem à justiça racial climática em discursos, mas sem assumir obrigações concretas", destaca o relatório da pesquisa.
Thaynah Gutierrez, assessora de Clima e Racismo Ambiental do Geledés, destaca que o combate ao racismo ambiental é fundamental para se alcançar a justiça climática. Segundo Gutierrez, "o racismo, ao se articular com outras formas de exploração, exclusão e discriminação social, intensifica processos de vulnerabilização socioambiental e aprofunda as violações de direitos humanos". (Foto: Kleber Silva).
Recomendações do estudo FGV-Geledés
A falta de legislação obrigatória específica para o combate ao racismo ambiental contrasta com o tamanho das populações que poderiam ser beneficiadas por esse tipo de normativa. O Brasil abriga a maior população afrodescendente fora do continente africano. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 56% da população brasileira se identifica como negra, ou seja, o somatório de pretos e pardos. São mais de 120 milhões de pessoas.
A população afrodescendente representa cerca de 200 milhões de pessoas em todo o mundo, segundo definição estabelecida pelo Grupo de Trabalho sobre Afrodescendentes das Nações Unidas. Essa é a população formada por descendentes das vítimas do tráfico transatlântico de escravizados e do mar Mediterrâneo - e não contabiliza a população que vive na África.
O estudo faz uma série de recomendações para a COP30. Entre elas, a participação das organizações afrodescendentes em espaços de decisão; que o termo "afrodescendentes" seja incluído nos documentos finais da conferência e que raça e gênero sejam mencionados nos planos de transição justa, ação de gênero e na meta global de adaptação. Pede ainda que sejam destinados recursos de financiamento e reparação para comunidades negras, quilombolas, periféricas e ribeirinhas, diante do duplo impacto do colonialismo e da crise ambiental. Outra sugestão é criar um mecanismo de monitoramento de racismo ambiental no âmbito do órgão da ONU que organiza as conferências climáticas, COPs (UNFCCC, na sigla em inglês, que significa Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas).
Lula critica gasto com guerras
Em seu discurso na abertura da COP30, Lula ressaltou os contrastes entre os cenários geopolíticos da Rio 92 e da COP30. "Há mais de 30 anos, na Cúpula da Terra, os líderes do mundo se reuniram no Rio de Janeiro para debater o desenvolvimento e a proteção do meio ambiente. Naquele momento, o multilateralismo vivia seu ápice. O mundo adentrava a chamada década das conferências, da qual emergiram as grandes bússolas que guiaram a Humanidade ao longo dessas três décadas. Entre elas, estão o conceito de desenvolvimento sustentável e o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, legados vivos da Rio 92", disse o presidente.
Saltando no tempo para hoje, Lula disse que "se os homens que fazem guerra estivessem nesta COP, iriam perceber que é muito mais barato colocar 1,3 trilhão de dólares para a gente acabar com um problema do que colocar 2,7 trilhões de dólares para fazer guerra como fizeram no ano passado".
Nesse ponto, Lula se referiu à dificuldade de os países mais ricos contribuírem para um fundo destinado aos países mais pobres para que possam enfrentar a emergência climática. O financiamento é um dos maiores desafios na COP30. Os recursos para medidas de mitigação e adaptação são cruciais para as populações mais impactadas pelo racismo ambiental. Na semana passada, no primeiro dia da Cúpula de Líderes, Lula lançou oficialmente o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês). Os aportes já chegam a 5,5 bilhões de dólares, mas o objetivo esperado é de de que supere os 125 bilhões de reais.
Segundo Lula, outro desafio que o mundo enfrenta hoje é o negacionismo espalhado pelo algoritmo. "Na era da desinformação, os obscurantistas rejeitam não só as evidências da ciência, mas também os progressos do multilateralismo. Eles controlam algoritmos, semeiam ódio e espalham o medo. Atacam as instituições, a ciência e as universidades. É hora de impor uma nova derrota aos negacionistas", conclamou.
O gargalo do financiamento climático
O embaixador Antônio Côrrea do Lago, presidente eleito da COP30, e Simon Stiell, secretário-executivo da UNFCCC, demonstraram otimismo na primeira coletiva de imprensa, na manhã desta segunda-feira (10), apesar das tensões na aprovação da agenda a ser debatida nesta edição da conferência. Côrrea do Lago destacou o compromisso do Brasil, ressaltando que o atraso na aprovação da agenda, resolvida na noite anterior, permitirá que se aprofunde em questões adicionais.
Já Stiell mencionou que o Acordo de Paris, de 2015, está "dobrando a curva" de aquecimento pela primeira vez, com novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) capazes de reduzir as emissões em 12% até 2035. Mas ele alertou que este progresso "não é nem de perto o suficiente" para evitar os impactos climáticos já sentidos por nações vulneráveis.
Na coletiva, os jornalistas perguntaram mais de uma vez sobre a meta de 1,3 trilhão de dólares. O Embaixador Côrrea do Lago afirmou que, embora o setor privado deva desempenhar um papel crucial para "incorporar o clima na economia" de forma mais ampla, o dinheiro público continua sendo essencial. Ele citou dados preocupantes de que cada dólar investido por bancos de desenvolvimento multilateral alavanca, em média, apenas 60 centavos de dólar de recursos privados. Ou seja, ele entende que é preciso aumentar a confiança e o engajamento do setor privado com projetos climáticos.
Também questionada, a presidência da COP30 elogiou a atuação da China e da Índia por usarem sua escala e tecnologia para baratear elementos essenciais da transição, como painéis solares e veículos elétricos, o que, indiretamente, funciona como cooperação internacional para o Sul Global. (Colaborou Eduardo Nunomura)
https://amazoniareal.com.br/lula-racismo-ambiental/
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