From Indigenous Peoples in Brazil
News
Amazônia é fundamental na estabilidade do clima do planeta. Mas quem decide o futuro da região?
17/07/2025
Autor: COSLOVSKY, Salo
Fonte: OESP - https://www.estadao.com.br/
Amazônia é fundamental na estabilidade do clima do planeta. Mas quem decide o futuro da região?
Em última instância, o destino da floresta será definido pelas pessoas que vivem, trabalham e votam ali
17/07/2025
Salo Coslovsky
Professor da Universidade de Nova York e pesquisador do Amazônia 2030
O ambientalismo brasileiro, carente de estruturas e instrumentos modernos de fomento econômico, está afastando as pessoas que deveria conquistar.
A floresta amazônica cumpre papel central na estabilidade do clima planetário e, por isso, muita gente, tanto no Brasil como no exterior, tem interesse em influenciar seu destino. É compreensível, mas em última instância, e independente do que qualquer um possa dizer ou fazer, o futuro da floresta será definido pelas pessoas que vivem, trabalham e votam na região.
Essa afirmação parece óbvia, mas ela constitui um desafio tão grande que muitos insistem em ignorá-la. Continuam acreditando que um grande aporte de capital combinado com alguns ajustes no mercado de carbono, geridos a partir de São Paulo, Brasília ou Bruxelas, convencerão os desmatadores a trocar sua motosserra pela produção de mudas e a coleta de sementes.
Talvez uma comparação com futebol ajude a convencer os recalcitrantes. A qualidade da equipe técnica, o vigor da torcida e a generosidade dos patrocinadores fazem alguma diferença, mas o jogo se ganha no campo, com base no empenho e talento dos 11 jogadores.
Mantendo essa analogia, se as eleições representam o placar, o ambientalismo brasileiro está perdendo de goleada, especialmente na região onde o jogo vale o campeonato. Um levantamento do Infoamazônia revelou que 90% dos prefeitos eleitos na Amazônia em 2024 pertencem a partidos contrários à pauta ambiental.
O mesmo levantamento mostrou que apenas 1% das Câmaras Municipais da região elegeram uma bancada ambiental. O próprio Plínio Valério, senador pelo Amazonas, exemplifica essa dinâmica quando esclarece que os insultos que dirigiu à ministra Marina Silva não foram grosserias gratuitas. No fundo, eles tinham lógica eleitoral: "Se eu pedir desculpas(...), não entro em casa, minha mulher me bota pra fora. E não me elejo nem vereador".
Apesar desse cenário desfavorável, proliferam os anúncios, cada vez mais frequentes, de novos fundos bilionários, públicos e privados, prometendo transformar a economia da região. Infelizmente, uma boa parcela desse dinheiro não existe. São uma declaração de intenções ou mero teatro para agradar a plateia. Outra parcela dos recursos anunciados é real, mas ainda assim arrecadar é a parte fácil. O difícil é gastar bem, de forma a engajar aqueles que estão dentro do campo, com capacidade de marcar gol.
A raiz do problema está na escassez de organizações modernas, capazes de promover dinamismo econômico sustentável.
Alguns órgãos, como a Casa Civil, os Ministérios da Fazenda, Transportes e Minas e Energia, o BNDES, a Petrobras e as grandes empresas privadas que circulam no seu entorno têm enorme capacidade de realização, mas ainda veem a floresta como obstáculo ou enfeite nos seus relatórios de sustentabilidade, em vez de ser fonte de riqueza material. A prova está na sua passividade diante da aprovação da nova lei geral do licenciamento ambiental, apelidada de PL da Devastação.
Os órgãos criados especialmente para fomentar a prosperidade da Amazônia, incluindo a Sudam, Suframa, Basa e Codevasf, operam em plano distinto daqueles que buscam fortalecer a economia de base florestal. São resquícios de um desenvolvimentismo ultrapassado que frequentemente agravam os problemas ambientais ao invés de contribuir com soluções.
Sobram alguns poucos órgãos públicos, sincronizados com ONGs e fundações filantrópicas, que de fato buscam promover uma economia de base florestal. A grande maioria deles, porém, é frágil e teimosa. Insistem em apostar suas fichas em programas de assistência social disfarçados de iniciativas econômicas e desenhados para atingir objetivos ambientais.
Esses programas cumprem papel importante em algumas comunidades, mas no cômputo geral o esforço é inócuo, uma distração que consome tempo e talentos escassos. Na melhor das hipóteses, eles geram pequenos enclaves sem chance de expansão. Na pior, perdem gradualmente o apoio dos seus próprios beneficiários, cada vez mais interessados em mudar para a cidade ou investir na produção de gado, soja ou ouro.
Sem órgãos efetivos empenhados em fomentar o desenvolvimento sustentável, não conseguiremos virar o jogo. Por isso, precisamos repensar nossa abordagem, começando por três reflexões. Primeiro, embora o ambiente global seja favorável às pautas ambientais, a economia política do Brasil e especialmente da Amazônia permanece hostil à preservação e restauração ambiental. Poucas pessoas que moram na região querem ver a floresta voltar quando deu tanto trabalho para suprimi-la.
Segundo, os instrumentos de comando e controle criados pelo Ministério do Meio Ambiente e seus aliados continuam sendo absolutamente necessários e precisam ser fortalecidos, mas estão longe de serem suficientes. Pior, eles sofrem imenso risco de desmonte sempre que há alternância de poder. Para que ganhem estabilidade, não adianta dotá-los de mais dinheiro, pois isso reforça o ressentimento e antagoniza aqueles que deveríamos conquistar. O que esses instrumentos precisam é estar escorados no interesse dos que empregam e dos que são empregados no País e especialmente na Amazônia.
E, terceiro, se queremos construir algo novo, precisamos começar com aquilo que já temos em mãos. A verdade é que não temos muito, e por isso não podemos prescindir da ajuda de ninguém. A Amazônia abriga um número modesto de negócios que apoiam a proteção e restauração da floresta. Mesmo que sejam majoritariamente pequenos e precários, esses empreendimentos já empregam moradores locais e podem empregar mais.
A região abriga também atravessadores que tantos criticam, mas que sabem como operar nas condições adversas da Amazônia. Há empresas convencionais que usam insumos de base florestal e podem querer comprar volumes maiores, com mais qualidade, para expandir suas operações. E há um bom número de políticos pragmáticos, dispostos a mudar de opinião quando for preciso para ganhar eleições. Juntos, eles são os jogadores que estão em campo. Até termos outras opções, são eles que podemos escalar.
Diante desse cenário, o desafio mais urgente é criar um sistema que fortaleça esses atores de forma progressiva, sob a disciplina do mercado, e onde o sucesso de um impulsiona o avanço dos demais. Não é uma tarefa fácil, e no início ela não conseguirá gerar resultados grandiosos. Mas se avançarmos na direção correta, aos poucos veremos que o esforço ganha escala, força e velocidade. Em poucos anos, a transformação pode ser notável.
https://www.estadao.com.br/economia/salo-coslovsky/amazonia-clima-planeta-quem-decide-futuro/
Em última instância, o destino da floresta será definido pelas pessoas que vivem, trabalham e votam ali
17/07/2025
Salo Coslovsky
Professor da Universidade de Nova York e pesquisador do Amazônia 2030
O ambientalismo brasileiro, carente de estruturas e instrumentos modernos de fomento econômico, está afastando as pessoas que deveria conquistar.
A floresta amazônica cumpre papel central na estabilidade do clima planetário e, por isso, muita gente, tanto no Brasil como no exterior, tem interesse em influenciar seu destino. É compreensível, mas em última instância, e independente do que qualquer um possa dizer ou fazer, o futuro da floresta será definido pelas pessoas que vivem, trabalham e votam na região.
Essa afirmação parece óbvia, mas ela constitui um desafio tão grande que muitos insistem em ignorá-la. Continuam acreditando que um grande aporte de capital combinado com alguns ajustes no mercado de carbono, geridos a partir de São Paulo, Brasília ou Bruxelas, convencerão os desmatadores a trocar sua motosserra pela produção de mudas e a coleta de sementes.
Talvez uma comparação com futebol ajude a convencer os recalcitrantes. A qualidade da equipe técnica, o vigor da torcida e a generosidade dos patrocinadores fazem alguma diferença, mas o jogo se ganha no campo, com base no empenho e talento dos 11 jogadores.
Mantendo essa analogia, se as eleições representam o placar, o ambientalismo brasileiro está perdendo de goleada, especialmente na região onde o jogo vale o campeonato. Um levantamento do Infoamazônia revelou que 90% dos prefeitos eleitos na Amazônia em 2024 pertencem a partidos contrários à pauta ambiental.
O mesmo levantamento mostrou que apenas 1% das Câmaras Municipais da região elegeram uma bancada ambiental. O próprio Plínio Valério, senador pelo Amazonas, exemplifica essa dinâmica quando esclarece que os insultos que dirigiu à ministra Marina Silva não foram grosserias gratuitas. No fundo, eles tinham lógica eleitoral: "Se eu pedir desculpas(...), não entro em casa, minha mulher me bota pra fora. E não me elejo nem vereador".
Apesar desse cenário desfavorável, proliferam os anúncios, cada vez mais frequentes, de novos fundos bilionários, públicos e privados, prometendo transformar a economia da região. Infelizmente, uma boa parcela desse dinheiro não existe. São uma declaração de intenções ou mero teatro para agradar a plateia. Outra parcela dos recursos anunciados é real, mas ainda assim arrecadar é a parte fácil. O difícil é gastar bem, de forma a engajar aqueles que estão dentro do campo, com capacidade de marcar gol.
A raiz do problema está na escassez de organizações modernas, capazes de promover dinamismo econômico sustentável.
Alguns órgãos, como a Casa Civil, os Ministérios da Fazenda, Transportes e Minas e Energia, o BNDES, a Petrobras e as grandes empresas privadas que circulam no seu entorno têm enorme capacidade de realização, mas ainda veem a floresta como obstáculo ou enfeite nos seus relatórios de sustentabilidade, em vez de ser fonte de riqueza material. A prova está na sua passividade diante da aprovação da nova lei geral do licenciamento ambiental, apelidada de PL da Devastação.
Os órgãos criados especialmente para fomentar a prosperidade da Amazônia, incluindo a Sudam, Suframa, Basa e Codevasf, operam em plano distinto daqueles que buscam fortalecer a economia de base florestal. São resquícios de um desenvolvimentismo ultrapassado que frequentemente agravam os problemas ambientais ao invés de contribuir com soluções.
Sobram alguns poucos órgãos públicos, sincronizados com ONGs e fundações filantrópicas, que de fato buscam promover uma economia de base florestal. A grande maioria deles, porém, é frágil e teimosa. Insistem em apostar suas fichas em programas de assistência social disfarçados de iniciativas econômicas e desenhados para atingir objetivos ambientais.
Esses programas cumprem papel importante em algumas comunidades, mas no cômputo geral o esforço é inócuo, uma distração que consome tempo e talentos escassos. Na melhor das hipóteses, eles geram pequenos enclaves sem chance de expansão. Na pior, perdem gradualmente o apoio dos seus próprios beneficiários, cada vez mais interessados em mudar para a cidade ou investir na produção de gado, soja ou ouro.
Sem órgãos efetivos empenhados em fomentar o desenvolvimento sustentável, não conseguiremos virar o jogo. Por isso, precisamos repensar nossa abordagem, começando por três reflexões. Primeiro, embora o ambiente global seja favorável às pautas ambientais, a economia política do Brasil e especialmente da Amazônia permanece hostil à preservação e restauração ambiental. Poucas pessoas que moram na região querem ver a floresta voltar quando deu tanto trabalho para suprimi-la.
Segundo, os instrumentos de comando e controle criados pelo Ministério do Meio Ambiente e seus aliados continuam sendo absolutamente necessários e precisam ser fortalecidos, mas estão longe de serem suficientes. Pior, eles sofrem imenso risco de desmonte sempre que há alternância de poder. Para que ganhem estabilidade, não adianta dotá-los de mais dinheiro, pois isso reforça o ressentimento e antagoniza aqueles que deveríamos conquistar. O que esses instrumentos precisam é estar escorados no interesse dos que empregam e dos que são empregados no País e especialmente na Amazônia.
E, terceiro, se queremos construir algo novo, precisamos começar com aquilo que já temos em mãos. A verdade é que não temos muito, e por isso não podemos prescindir da ajuda de ninguém. A Amazônia abriga um número modesto de negócios que apoiam a proteção e restauração da floresta. Mesmo que sejam majoritariamente pequenos e precários, esses empreendimentos já empregam moradores locais e podem empregar mais.
A região abriga também atravessadores que tantos criticam, mas que sabem como operar nas condições adversas da Amazônia. Há empresas convencionais que usam insumos de base florestal e podem querer comprar volumes maiores, com mais qualidade, para expandir suas operações. E há um bom número de políticos pragmáticos, dispostos a mudar de opinião quando for preciso para ganhar eleições. Juntos, eles são os jogadores que estão em campo. Até termos outras opções, são eles que podemos escalar.
Diante desse cenário, o desafio mais urgente é criar um sistema que fortaleça esses atores de forma progressiva, sob a disciplina do mercado, e onde o sucesso de um impulsiona o avanço dos demais. Não é uma tarefa fácil, e no início ela não conseguirá gerar resultados grandiosos. Mas se avançarmos na direção correta, aos poucos veremos que o esforço ganha escala, força e velocidade. Em poucos anos, a transformação pode ser notável.
https://www.estadao.com.br/economia/salo-coslovsky/amazonia-clima-planeta-quem-decide-futuro/
The news items published by the Indigenous Peoples in Brazil site are researched daily from a variety of media outlets and transcribed as presented by their original source. ISA is not responsible for the opinios expressed or errors contained in these texts. Please report any errors in the news items directly to the source