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A mineração sob as cordas e a incompetência da Alaska Mineração em Bonfim (MG)

07/10/2025

Autor: Fernanda Santos Tomaz, Julia Sanders, Marcelo Bruno Ribeiro Barbosa e Sara Abreu

Fonte: Brasil de Fato - https://www.brasildefato.com.br/



A mineração sob as cordas e a incompetência da Alaska Mineração em Bonfim (MG)
Operação Rejeito exige que pautemos um novo modelo de mineração

No dia 30 de setembro, a pedido do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), foi realizada, no município de Bonfim, uma reunião pública para tratar do processo de implantação da lavra a céu aberto da Mina Gavião, de propriedade da empresa Alaska Mineração, que visa extrair minério de ferro na região através do método à seco (processo de produção que não utiliza barragem de rejeitos).

A Mina Gavião, caso saia do papel, estará localizada entre os municípios de Bonfim e Brumadinho e impactará economicamente, culturalmente e ambientalmente sobretudo os agricultores familiares da região, como os moradores das centenárias comunidades de Aroucas e Eixo Quebrado (Bonfim e Brumadinho, respectivamente), que têm se organizado para barrar a implantação da Mina Gavião desde a pandemia da covid-19, quando a mineradora passou a investir com maior fôlego para viabilizar este projeto.

A reunião pública está inserida dentro do processo de licenciamento ambiental e foi um ótimo exemplo do atual cenário de falta de credibilidade do setor mineral em Minas Gerais, sobretudo no que diz respeito às licenças ambientais, após denúncias feitas na Operação Rejeito.

Nesta operação, a Polícia Federal (PF) desmascarou um forte esquema de obtenção de licenças fraudulentas para empresas mineradoras com participação de agentes do Estado, inclusive membros do alto escalão do governo Zema (quem paga, ganha autorização para minerar!).


O Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) feito pela Alaska Mineração, peça fundamental em qualquer processo de licenciamento ambiental, possui inúmeras falhas, que vão desde o não dimensionamento correto da Área Diretamente Afetada (ADA), subnotificação do total de famílias atingidas e amostragem muito pequena, até a não consideração ou minimização de impactos socioambientais, como a não mensuração e exposição clara dos impactos provocados pelo método de mineração à seco (contaminação do ar em decorrência das explosões e da moagem do material; poluição sonora; rachaduras em edificações vizinhas ao projeto por trepidação; contaminação de águas e riscos de deslizamentos de pilhas de rejeito; etc.).

Pilhas de rejeito
Apesar do elevado risco geotécnico associado às pilhas de rejeito, o estado de Minas Gerais ainda não cumpriu adequadamente seu papel normativo e regulador sobre essas estruturas.

Após os crimes de Mariana e Brumadinho, os empreendimentos minerários passaram a sustentar uma narrativa enganosa de que as pilhas de resíduos industriais teriam baixo impacto socioambiental, pois verificou-se ser socialmente e economicamente mais viável apostar na narrativa de projetos de mineração à seco.

No entanto, tal escolha não decorre de um menor impacto ambiental, mas sim da possibilidade de reduzir custos e responsabilidades das mineradoras.

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Hoje, não se sabe se essas estruturas foram devidamente projetadas e construídas, se a indústria mineral está adotando as medidas preventivas, se as pilhas se encontram estáveis e quais riscos apresentam. Ao apresentar um projeto de mineração à seco significa que o que se busca é eximir-se da obrigação de explicitar seus reais impactos e, assim, evitar condicionantes ambientais - como se verifica no caso da Alaska Mineração.

Incompetência e autoritarismo
Sabendo das falhas no EIA/RIMA, os presentes na reunião pública indagaram por diversas vezes a Alaska Mineração sobre os impactos que serão provocados pelo projeto, bem como sobre as possíveis soluções pensadas pela empresa.

Porém, uma após a outra, as perguntas feitas pelas comunidades foram ignoradas pelos técnicos da mineradora, seja por desconsideração ou simplesmente por incompetência técnica para lidar com aquele processo (o que ficou evidente na reunião).

A postura da empresa durante a reunião pública foi lamentável. Em vez de fornecer respostas técnicas consistentes, seus representantes recorreram a declarações absurdas, como "não haverá impacto na água" ou "o impacto é insignificante", e chegaram a gritar com as comunidades presentes.

Em tom de desrespeito, a própria representante da mineradora questionou se as pessoas não queriam empregos e insinuou que elas dependiam de programas sociais como o Bolsa Família.

Postura da empresa durante a reunião pública foi lamentável

Ao longo de mais de três horas, a Alaska Mineração promoveu um verdadeiro show de horrores, revelando não apenas a fragilidade técnica de sua equipe, mas também o profundo desprezo pelo diálogo social. A reunião foi, portanto, uma prévia do descaso com o qual o empreendimento tende a tratar as comunidades atingidas, caso venha a se instalar.

A negligência foi tanta que, ao final da reunião pública, a representação da Fundação Estadual de Meio Ambiente (FEAM), que conduziu o espaço, decretou que, por falta de respostas da Alaska às questões levantadas pelas comunidades em relação ao empreendimento, o objetivo da reunião pública não havia sido alcançado e portanto ela estava invalidada. Necessitando de nova convocação e de um melhor preparo por parte da empresa para lidar com as questões concretas apresentadas pelo povo de Bonfim e região.

Oportunidade
Como diria Paulo Freire, trata-se de uma situação que apresenta para o povo mineiro um inédito viável em meio à uma conjuntura na qual a mineração está sob as cordas, com as denúncias da Operação Rejeito e a falta de credibilidade do setor e dos órgãos licenciadores e fiscalizadores do Estado.

A incompetência (ou má fé) da Alaska no processo de licenciamento infelizmente não é algo que diz respeito somente à esta empresa, ao contrário, é uma estratégia cristalizada no setor mineral que, como evidenciado nas últimas semanas, vem contando desde sempre com a vista grossa do Estado, em uma ampla e criminosa troca de favores para fazer passar licenças mesmo que em processos inundados de incompetência técnica, como o citado neste artigo.

A grande diferença hoje é que a credibilidade do setor mineral está em baixa, os órgãos licenciadores estão constrangidos e o povo mineiro mais do que nunca está atento. O inédito viável é um sonho possível, que emerge de situações-limite e que somente é alcançado pela construção de consciência crítica e através de ações coletivas visando a transformação da realidade.

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Assim, não é pouca coisa que uma reunião pública tenha sido anulada no ato (algo extremamente incomum de ocorrer), sem necessidade de judicialização, pela falta de capacidade da empresa mineradora de lidar com as falhas de seu próprio estudo "técnico".

Também é surpreendente a postura da FEAM, que nos últimos anos tem ignorado diversas inconsistências em estudos de impacto e dado licenças para a mineração apesar das falhas processuais e dos EIA/RIMA.

Como dito, abre-se uma janela histórica importante para avançarmos na construção de um novo modelo de mineração em Minas Gerais e no Brasil, um inédito viável. Desde 2019, quando ocorreu o rompimento da barragem de rejeitos da Vale S.A em Brumadinho, o setor mineral não é tão questionado pela população.

O esquema de fraudes nos licenciamentos, a incompetência das empresas em lidarem com as questões concretas da vida do povo, a falta de credibilidade das chefias dos órgãos ambientais do Estado (não dos servidores de carreira, que inclusive estão em greve lutando pela transformação da política ambiental de Minas Gerais) e a mobilização popular são elementos importantes que nos fazem acreditar em um novo caminho: um modelo mineral pautado em um projeto de país, justiça tributária, responsabilidade ambiental de fato, respeito à diversidade cultural, controle social e soberania popular na mineração.

Marcelo Bruno Ribeiro Barbosa é agrônomo (UNIFESSPA), mestre em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade (CPDA/UFRRJ) e militante do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM).

Fernanda Santos Tomaz é formada em Direito (UEMG), assessora jurídica popular, articuladora da Rede Nacional de Advogados Populares (Renap) e militante do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM).

Sara Abreu é licenciada em Educação do Campo (UFV) e militante do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM).

Julia Sanders é economista e mestre em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e militante do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM).

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Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Editado por: Ana Carolina Vasconcelos

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