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Borracha e urucum protegem AC

06/11/2008

Fonte: OESP, Vida, p. H3



Borracha e urucum protegem AC
Projetos de índios e seringueiros ganham prêmio por aliar preservação da mata com redução da pobreza

Giobana Girardi

Não faltam no Brasil projetos que tentam aliar conservação da natureza com lucro para as comunidades do entorno - vide as diversas iniciativas de extrativismo na Amazônia -, mas são poucos os que conseguem se firmar como uma alternativa viável. Bons exemplos dessa persistência são dois projetos acreanos que acabam de ser premiados pela Organização das Nações Unidas (ONU) por combater a pobreza ao mesmo tempo em que preservam a biodiversidade.

Impulsionados pela crise da borracha a partir do fim dos anos 80, quando o preço do látex despencou e muitos seringueiros ficaram desempregados, vendo-se obrigados a buscar opções menos sustentáveis, os dois projetos trouxeram saídas lucrativas para manter a floresta em pé, um deles utilizando o próprio seringal e o outro, o urucum.

"Naquela época eu trabalhava com cooperativas de borracha, vendia o material para São Paulo e, de repente, não tinha mais como sobreviver, voltei a dar aula e comecei a pesquisar alguma outra forma de lidar com a borracha", conta o professor de português Francisco Samonek, paranaense que se mudou para o Acre achando ter encontrado na seringueira uma forma mais fácil de ganhar dinheiro.

Ele queria criar uma maneira de beneficiar a borracha para produzir algo além do preparo tradicional vendido para a produção de pneus. A idéia veio de povos indígenas kaxinawá e shanenawá, que habitavam a região e antes dos seringueiros já misturavam fibras vegetais ao látex para fazer uma borracha líquida, o chamado "encauchado", base do couro vegetal.

"Recuperamos essa técnica artesanal e juntamos uma nova tecnologia de elevar o pH do látex com uma mistura de água e cinzas de fornos e roçados", conta Samonek, coordenador do Pólo de Proteção da Biodiversidade e Uso Sustentável dos Recursos Naturais (Poloprobio), instituto criado para viabilizar o negócio. Como é mais maleável, o encauchado pode ser usado para a confecção de artesanato, mas também substitui barro na produção de telhas e tijolos.

O negócio deu tão certo que hoje 580 pessoas em 28 unidades trabalham na produção do material e dos seus vários subprodutos, como embalagens, camisetas pintadas com grafismos indígenas, mantas, jogos americanos e porta-lápis.

A Universidade Federal do Acre encampou a proposta e contratou Samonek para coordenar a qualificação de mais pessoal. Recentemente, depois de ganhar vários prêmios (fora os US$ 5 mil do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), o Poloprobio fechou convênios com Sebrae e Petrobrás para abrir mais unidades na região.

Segundo Samonek, pelo sistema convencional o seringueiro tirava cerca de R$ 2,50 por quilo de borracha vendida para os fabricantes de pneus. Para fazer um quilo do produto são necessários dois litros de látex. Hoje, esse mesmo volume pode render de R$ 40 (preço de uma manta emborrachada que serve para fazer mochilas, por exemplo) a R$ 80 (valor de dez porta-lápis de fibras e borracha) ou até R$ 120 (obtidos com a venda de 15 embalagens). "E, se um litro do encauchado for usado só para pintar camiseta, dá para fazer umas cem, rendendo até R$ 1 mil", diz.

PELES VERMELHAS

A saída encontrada pelos índios yawanawás para lidar com a crise da borracha foi uma árvore muito familiar deles, o urucum. Tradicionalmente usado para a confecção de elaborados desenhos corporais, o fruto virou negócio. "Com o declínio da borracha, o povo ficou sem função, foi trabalhar em fazendas. Aconteceu uma dispersão total", conta Tashka Yawanawá, um dos idealizadores da cooperativa Coopyawa, que viria a ajudar a gerar renda por meio da promoção do urucum na comunidade.

A virada começou com a Rio-92, quando representantes da tribo foram ao evento. Lá tiveram contato com um empresário da indústria de cosméticos americana Aveda, que se mostrou interessado por aquele corante natural usado pelos índios para expressar sua cultura. "Ele queria agregar um diferencial étnico ao seu produto e uma consciência socioambiental", lembra Tashka.

No entanto, seriam necessários ainda alguns anos para que o povo passasse a cultivar o urucum com fins comerciais e aprendesse a lidar com dinheiro. "O índio não pode ser empregado de uma empresa. Tem de ter o tempo para pescar, caçar, fazer suas festas", diz. O contrato com a Aveda foi feito em 2003 e dura até hoje. O investimento trouxe melhorias para a tribo e levou até à criação de uma grife com os grafismos yawanawás. "O melhor foi que isso nos juntou e fortaleceu nossa cultura. Trouxe o orgulho de ser índio", conta.

OESP, 06/11/2008, Vida, p. H3
 

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