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Países passam a ter obrigação de frear danos climáticos
04/07/2025
Autor: Liana Melo
Fonte: Projeto Colabora - https://projetocolabora.com.br/
Países passam a ter obrigação de frear danos climáticos
Em decisão inédita, Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão da OEA, define que a emergência climática é vista, pelos olhos da Justiça, como uma crise também dos direitos humanos.
Faltando pouco mais de quatro meses para a COP30, em Belém, em novembro, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA), anunciou, na quinta (03/07), uma decisão histórica. Num documento de 234 páginas, responsabilizou os estados no combate à crise climática. É a primeira vez que a emergência climática é vista, pelos olhos da Justiça, como uma crise também dos direitos humanos.
A decisão da CIDH é fruto de uma solicitação conjunta feita pela Colômbia e o Chile em janeiro de 2023. Com jurisdição sobre 20 países da América Latina e do Caribe, a CIDH concluiu ainda que os países devem aprovar leis para enquadrar as empresas. Diz o texto aprovado que o setor privado deve atuar com "devida diligência em relação aos direitos humanos e às mudanças climáticas ao longo de sua cadeia de valor". E mais: definiu que, sendo o meio ambiente um sujeito de direito, os danos ambientais têm efeito intergeracional, ou seja, eles não terminam com o ressarcimento exclusivo das vítimas já que impactam também as gerações futuras.
Co-fundadora do Centro de Direitos Humanos e Meio Ambiente (CHRE, na sigla em inglês), a argentina Romina Picolotti, falou com o #Colabora sobre a decisão histórica do CIDH.
#Colabora - Como a CIDH chegou a essa decisão?
Romina Picolotti - É a primeira vez que, na história da Corte, uma decisão é precedida de tanta participação. Foram apresentadas pouco mais de 260 observações ao tribunal, sendo 36 de estados, 17 de indígenas e comunidades tradicionais, mais de 90 de sindicatos e ONGs, 70 de instituições acadêmicas e outras 45 de especialistas. É uma prova de que a questão climática requer uma enorme atenção da Justiça. Ao todo, foram sete dias de reunião em Barbabos, um país altamente vulnerável às mudanças climáticas, e em Manaus, onde os membros da CIDH ouviram pouco mais de 150 depoimentos. Foi um processo de escuta riquíssimo, com reuniões diárias que chegavam a durar dez horas, e onde estiveram presentes os sete membros da CIDH.
#Colabora - A decisão da Corte pode influenciar o Tribunal Superior das Nações Unidas?
Romina Picolotti - Decididamente, terá uma influência positiva sobre as futuras decisões do Tribunal. Seria desproporcional e inconsistente contradizer uma decisão da Corte. Por isso, acredito que terá uma influência muito positiva.
#Colabora - Acredita que haverá um crescimento da litigância climática?
Romina Picolotti - A resposta é sim. Com essa decisão, os países não têm mais a possibilidade de não fazerem nada, porque passarão a ter a obrigação legal de enfrentar a crise climática. O enfrentamento inclui mitigar os efeitos permanentes a longo prazo e reduzir as emissões a curto prazo. Vou dar um exemplo: a decisão da Corte é uma espécie de freio de mão para um carro que está andando em alta velocidade numa estrada. As mudanças climáticas estão caminhando numa velocidade de 100km/ hora. Precisamos diminuir essa velocidade. A mudança climática está precisando de um freio e alguns gases, como o metano, por exemplo, tem um enorme potencial para reduzir o aquecimento global no curto prazo. Essa decisão da Corte é, sem dúvida nenhuma, o documento jurídico mais importante desse século. Algumas questões que envolviam algum grau de litigância deixam, a partir de agora, de ser controversas. E países e empresas não têm mais a justificativa de não implementar ações de mitigação. A decisão da Corte fez com que a Justiça passasse a ter um papel fundamental para enfrentar a mudança climática.
#Colabora - O que significa considerar o meio ambiente um sujeito de direito?
Ao reconhecer a natureza como sujeito de direito, o Tribunal não promoveu uma visão ecocêntrica abstrata, mas sim se posicionou firmemente a partir de uma perspectiva profundamente humanista. O reconhecimento dos direitos da natureza é apresentado como uma ferramenta para proteger a vida humana, a dignidade e os direitos fundamentais diante da devastação ambiental.
Acredito ser igualmente crucial enquadrar este Parecer Consultivo como um convite para embarcar em um caminho de paz. Ao delinear um roteiro para enfrentar a emergência climática, o Tribunal apela aos Estados para que ajam com urgência para evitar cenários de caos e conflito, que poderiam levar a processos de militarização regional diante dos impactos extremos da travessia dos pontos sem retorno. Nesse sentido, o Tribunal desempenha um papel preventivo, convocando os Estados a embarcarem coletivamente em um caminho rumo à estabilidade, à justiça e à paz.
Um passo crucial para a paz é desacelerar o ritmo do aquecimento global no curto prazo, dando assim à humanidade uma chance real de permanecer abaixo do limite de 1,5oC. Essa janela de oportunidade está se fechando rapidamente, e o Parecer Consultivo fornece uma base jurídica vital para que os Estados ajam agora.
#Colabora - Quais as sanções que não cumprimento desse Parecer Consultivo pode significar?
Os Estados têm a obrigação, sob a doutrina do controle de convencionalidade, de adaptar suas políticas públicas à Opinião Consultiva, na medida em que esta constitua a interpretação mais fidedigna do alcance de suas obrigações em relação à emergência climática no âmbito da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. O descumprimento deste guia interpretativo pode expor os Estados à responsabilidade internacional perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
#Colabora - Como acha que o Brasil se enquadra nesse novo cenário?
Romina Picolotti - O Brasil precisa tomar cuidado com alguns setores políticos, representados no Congresso Nacional, que são favoráveis a enfraquecer o Ministério do Meio Ambiente e relaxar os controles e as avaliações ambientais. Com essa decisão da Corte, os estados, e também o próprio Congresso, passam a ter a obrigação de não retroceder. Retrocessos podem levar o Brasil ao banco dos réus por violar obrigações legais impostas por uma Corte internacional.
#Colabora - Em que medida essa decisão por impactar o resultado da COP30?
Romina Picolotti - A decisão é uma ferramenta muito importante e levará a sociedade civil a cobrar cada vez mais. Por enquanto, não está muito claro o que vai acontecer na COP30 em Belém porque estamos vendo um vazio de implementação nesse momento. Portanto, penso que a opinião do Tribunal possa ser usada como um roteiro para promover medidas concretas de implementação que estejam em conformidade com as obrigações legais.
https://projetocolabora.com.br/ods13/agora-e-lei-paises-passam-a-ter-obrigacao-de-frear-danos-climaticos/
Em decisão inédita, Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão da OEA, define que a emergência climática é vista, pelos olhos da Justiça, como uma crise também dos direitos humanos.
Faltando pouco mais de quatro meses para a COP30, em Belém, em novembro, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA), anunciou, na quinta (03/07), uma decisão histórica. Num documento de 234 páginas, responsabilizou os estados no combate à crise climática. É a primeira vez que a emergência climática é vista, pelos olhos da Justiça, como uma crise também dos direitos humanos.
A decisão da CIDH é fruto de uma solicitação conjunta feita pela Colômbia e o Chile em janeiro de 2023. Com jurisdição sobre 20 países da América Latina e do Caribe, a CIDH concluiu ainda que os países devem aprovar leis para enquadrar as empresas. Diz o texto aprovado que o setor privado deve atuar com "devida diligência em relação aos direitos humanos e às mudanças climáticas ao longo de sua cadeia de valor". E mais: definiu que, sendo o meio ambiente um sujeito de direito, os danos ambientais têm efeito intergeracional, ou seja, eles não terminam com o ressarcimento exclusivo das vítimas já que impactam também as gerações futuras.
Co-fundadora do Centro de Direitos Humanos e Meio Ambiente (CHRE, na sigla em inglês), a argentina Romina Picolotti, falou com o #Colabora sobre a decisão histórica do CIDH.
#Colabora - Como a CIDH chegou a essa decisão?
Romina Picolotti - É a primeira vez que, na história da Corte, uma decisão é precedida de tanta participação. Foram apresentadas pouco mais de 260 observações ao tribunal, sendo 36 de estados, 17 de indígenas e comunidades tradicionais, mais de 90 de sindicatos e ONGs, 70 de instituições acadêmicas e outras 45 de especialistas. É uma prova de que a questão climática requer uma enorme atenção da Justiça. Ao todo, foram sete dias de reunião em Barbabos, um país altamente vulnerável às mudanças climáticas, e em Manaus, onde os membros da CIDH ouviram pouco mais de 150 depoimentos. Foi um processo de escuta riquíssimo, com reuniões diárias que chegavam a durar dez horas, e onde estiveram presentes os sete membros da CIDH.
#Colabora - A decisão da Corte pode influenciar o Tribunal Superior das Nações Unidas?
Romina Picolotti - Decididamente, terá uma influência positiva sobre as futuras decisões do Tribunal. Seria desproporcional e inconsistente contradizer uma decisão da Corte. Por isso, acredito que terá uma influência muito positiva.
#Colabora - Acredita que haverá um crescimento da litigância climática?
Romina Picolotti - A resposta é sim. Com essa decisão, os países não têm mais a possibilidade de não fazerem nada, porque passarão a ter a obrigação legal de enfrentar a crise climática. O enfrentamento inclui mitigar os efeitos permanentes a longo prazo e reduzir as emissões a curto prazo. Vou dar um exemplo: a decisão da Corte é uma espécie de freio de mão para um carro que está andando em alta velocidade numa estrada. As mudanças climáticas estão caminhando numa velocidade de 100km/ hora. Precisamos diminuir essa velocidade. A mudança climática está precisando de um freio e alguns gases, como o metano, por exemplo, tem um enorme potencial para reduzir o aquecimento global no curto prazo. Essa decisão da Corte é, sem dúvida nenhuma, o documento jurídico mais importante desse século. Algumas questões que envolviam algum grau de litigância deixam, a partir de agora, de ser controversas. E países e empresas não têm mais a justificativa de não implementar ações de mitigação. A decisão da Corte fez com que a Justiça passasse a ter um papel fundamental para enfrentar a mudança climática.
#Colabora - O que significa considerar o meio ambiente um sujeito de direito?
Ao reconhecer a natureza como sujeito de direito, o Tribunal não promoveu uma visão ecocêntrica abstrata, mas sim se posicionou firmemente a partir de uma perspectiva profundamente humanista. O reconhecimento dos direitos da natureza é apresentado como uma ferramenta para proteger a vida humana, a dignidade e os direitos fundamentais diante da devastação ambiental.
Acredito ser igualmente crucial enquadrar este Parecer Consultivo como um convite para embarcar em um caminho de paz. Ao delinear um roteiro para enfrentar a emergência climática, o Tribunal apela aos Estados para que ajam com urgência para evitar cenários de caos e conflito, que poderiam levar a processos de militarização regional diante dos impactos extremos da travessia dos pontos sem retorno. Nesse sentido, o Tribunal desempenha um papel preventivo, convocando os Estados a embarcarem coletivamente em um caminho rumo à estabilidade, à justiça e à paz.
Um passo crucial para a paz é desacelerar o ritmo do aquecimento global no curto prazo, dando assim à humanidade uma chance real de permanecer abaixo do limite de 1,5oC. Essa janela de oportunidade está se fechando rapidamente, e o Parecer Consultivo fornece uma base jurídica vital para que os Estados ajam agora.
#Colabora - Quais as sanções que não cumprimento desse Parecer Consultivo pode significar?
Os Estados têm a obrigação, sob a doutrina do controle de convencionalidade, de adaptar suas políticas públicas à Opinião Consultiva, na medida em que esta constitua a interpretação mais fidedigna do alcance de suas obrigações em relação à emergência climática no âmbito da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. O descumprimento deste guia interpretativo pode expor os Estados à responsabilidade internacional perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
#Colabora - Como acha que o Brasil se enquadra nesse novo cenário?
Romina Picolotti - O Brasil precisa tomar cuidado com alguns setores políticos, representados no Congresso Nacional, que são favoráveis a enfraquecer o Ministério do Meio Ambiente e relaxar os controles e as avaliações ambientais. Com essa decisão da Corte, os estados, e também o próprio Congresso, passam a ter a obrigação de não retroceder. Retrocessos podem levar o Brasil ao banco dos réus por violar obrigações legais impostas por uma Corte internacional.
#Colabora - Em que medida essa decisão por impactar o resultado da COP30?
Romina Picolotti - A decisão é uma ferramenta muito importante e levará a sociedade civil a cobrar cada vez mais. Por enquanto, não está muito claro o que vai acontecer na COP30 em Belém porque estamos vendo um vazio de implementação nesse momento. Portanto, penso que a opinião do Tribunal possa ser usada como um roteiro para promover medidas concretas de implementação que estejam em conformidade com as obrigações legais.
https://projetocolabora.com.br/ods13/agora-e-lei-paises-passam-a-ter-obrigacao-de-frear-danos-climaticos/
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