De Povos Indígenas no Brasil
The printable version is no longer supported and may have rendering errors. Please update your browser bookmarks and please use the default browser print function instead.

Notícias

A improbidade que mata os ianomâmis

12/05/2014

Autor: SERVA, Leão

Fonte: FSP, Cotidiano, p. C2



A improbidade que mata os ianomâmis
Enquanto Comissão da Verdade estuda crimes da ditadura, atuais mortes são alvo de investigação

Leão Serva

Quando a Comissão da Verdade sobre a ditadura militar inicia a análise do quase genocídio dos ianomâmis nos anos 1970 (na abertura da rodovia Perimetral) e 1980 (com a massiva invasão garimpeira), um novo aumento das mortes é tema de uma investigação atual.
Os índios do extremo norte voltam a padecer de altas taxas de mortalidade, vítimas de uma ou mais doenças típicas da sociedade contemporânea, como incompetência administrativa e, talvez, corrupção, como suspeita o Ministério Público.
Ao contrário de povos indígenas menos famosos, que sofrem com a falta de verbas para saúde, na área ianomâmi os gastos do Ministério da Saúde subiram quase seis vezes nos últimos dez anos (2004-2013).
Mas, no mesmo período, a incidência de malária subiu de 41,8 por mil habitantes para 70,6.
Enquanto o Brasil se tornava um país rico, a mortalidade infantil desses índios atingia o índice de 113 por mil nascidos vivos em 2013 --semelhante aos africanos Serra Leoa e Somália, assolados por guerras (o Brasil tem 19,6, conforme o IBGE).
A degradação dos índices de saúde entre os ianomâmis motivou um protesto no início do ano, forçando a renúncia da coordenadora do Ministério da Saúde em Boa Vista (RR), Joana Claudete Schuertz.
Desde então, a substituta interina segue no posto. Perguntada por este colunista se os problemas se deviam a falta de dinheiro, Maria de Jesus do Nascimento disse: "Não, dinheiro não falta... Foi problema de gestão, mesmo".
Não falta dinheiro, mas faltam médicos, equipamentos, medicamentos. Por isso, quando uma pessoa fica doente, o remédio é mandá-la para Boa Vista de avião.
A medicina preventiva é sempre considerada estratégia fundamental para áreas indígenas. Era o que pregavam as ONGs conveniadas com o governo, a partir de 2000, para gerir a saúde na área ianomâmi. Por quatro anos, elas receberam dinheiro público para contratar os agentes comunitários de saúde e médicos, implantar postos, comprar remédios, fazer vacinação. Os índices melhoraram, mas sua autonomia irritava funcionários públicos, que perdiam funções.
Após a eleição de Lula, com apoio dos sindicatos do funcionalismo, o discurso corporativista se fortaleceu. Ganhou também apoio de setores conservadores, que viam influência esquerdista e estrangeira nas ONGs. O gasto anual com a saúde ianomâmi (cerca de R$ 14 milhões, atualizados) era apontado como exagerado. O ministério voltou a centralizar a política.
Dez anos depois, com um orçamento real seis vezes maior, a saúde dos índios só piora. Um gasto do ministério que era muito atacado pelas novas autoridades que chegaram ao poder em 2003 foi radicalizado: os custos com aviões para transportar doentes da Terra Indígena para Boa Vista. Em 2013, R$ 21 milhões foram para a conta de duas empresas de aviação, exatamente metade dos R$ 42 milhões despendidos pelo Ministério da Saúde em ações na área ianomâmi.
O Ministério Público Federal faz investigação para apurar o que degrada a situação. Problemas de gestão, quando matam, também são improbidade administrativa. A Procuradoria quer saber, também, detalhes sobre os gastos com aviões, pois os números são grandes demais para retratar apenas incompetência. Talvez reflitam esperteza.

FSP, 12/05/2014, Cotidiano, p. C2

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165505-a-improbidade-que-mata-os-ianomamis.shtml
 

As notícias publicadas no site Povos Indígenas no Brasil são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos .Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.