De Povos Indígenas no Brasil
The printable version is no longer supported and may have rendering errors. Please update your browser bookmarks and please use the default browser print function instead.
Notícias
Presidente de empresa de potássio oferece compra de terra a indígenas por posição favorável; ouça áudios
21/11/2023
Autor: Vinicius Sassine
Fonte: Folha de São Paulo - https://www1.folha.uol.com.br
OUTRO LADO: Potássio do Brasil diz que benefícios a muras da região de Autazes (AM) são públicos
Vinicius Sassine
MANAUS
O presidente da empresa Potássio do Brasil, Adriano Espeschit, prometeu a indígenas muras a compra e entrega de 5.000 hectares de terras em caso de posição favorável em assembleia ao empreendimento de exploração de potássio na região de Autazes (AM), entre os rios Madeira e Amazonas.
A oferta foi seguida de falas de Espeschit contrárias à demarcação do território, apesar do início de procedimentos formais para a delimitação por parte da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), que constituiu um grupo técnico em agosto.
O presidente da Potássio do Brasil, subsidiária do banco canadense Forbes & Manhattan, disse ainda aos muras que o território só poderia virar terra indígena ao fim da retirada do minério, num prazo de 23 a 34 anos. Em nota, a empresa afirma que os benefícios aos muras são públicos.
O potássio é base para fertilizantes utilizados na agricultura em larga escala. O empreendimento em uma região preservada da Amazônia tem apoio no governo Lula (PT). O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), já deu declarações favoráveis ao projeto.
A participação de Espeschit numa assembleia de uma pequena parte dos muras, em 22 de setembro, foi gravada, como consta em manifestação do MPF (Ministério Público Federal) no Amazonas. O áudio de mais de uma hora foi enviado à Procuradoria. O presidente da Potássio do Brasil indicou em sua fala não saber que estava sendo gravado.
No último dia 15, o MPF apontou diversos indícios de cooptação de indígenas e de atropelo a processos internos de consulta, principalmente da aldeia Soares, a mais impactada pelo projeto, com sobreposição de áreas.
Em atendimento a pedido da Procuradoria, a Justiça Federal no Amazonas determinou no dia seguinte a suspensão de "qualquer atitude de coação, manipulação, fraude, intimidação, ameaça, pressão e cooptação" contra muras por parte da Potássio do Brasil.
Ouça abaixo dois trechos das falas de Espeschit:
"Vocês aprovando esse projeto, não pode haver criação de terra indígena", disse o presidente da empresa na reunião gravada. "Porque aprovar e criar uma terra indígena vai inviabilizar do mesmo jeito."
Em seguida, Espeschit fez a promessa da compra de terras. "A gente assumiu o compromisso de comprar uma área dez vezes maior do que a gente vai ocupar em superfície. Estamos assumindo o compromisso de comprar 5.000 hectares, e esses 5.000 hectares estariam disponíveis para programas a partir de hoje, se vocês votarem favorável, do plano Bem Viver Mura."
Ele prometeu ainda empregos, possibilidades de empreender -com prioridade na contratação de empresas de indígenas- e royalties. "Não é terra indígena, é região do povo mura. E o povo mura pode se sentir orgulhoso de estar participando disso."
Segundo o presidente da Potássio do Brasil, o território poderia ser indígena "a partir do momento que acabar a retirada do minério". "O direito de vocês é adquirido. É só uma postergação de tempo. Vai continuar sendo possível, depois que a empresa terminar os 23 anos, ou os 34 anos."
Espeschit disse ainda que a aprovação do empreendimento de exploração de potássio e a demarcação de terra indígena são inconciliáveis. "Se você fizer a aprovação do projeto e solicitar uma terra indígena em cima, você está desaprovando o projeto."
Ele afirmou que "a propriedade de uma terra indígena continua sendo do governo". "A hora que eu colocar a terra dentro do plano Bem Viver Mura, se ela for transferida ao CNPJ de alguma entidade indígena, aí sim é vida, aí sim é propriedade."
O representante da Potássio do Brasil reforçou aos indígenas presentes, que iriam votar em seguida sobre o empreendimento, dois pontos compreendidos como "cruciais": "a não demarcação de terra indígena em cima da área do Soares" e "logicamente a aprovação do projeto".
A Potássio do Brasil, em nota, afirmou que todos os "benefícios sociais e econômicos" previstos para os muras são públicos.
"Transformar mecanismos de proteção social do projeto, amplamente conhecidos, em lances secretos de uma conspiração econômica contra indígenas é uma ação que vai contra a proteção do meio ambiente, a independência e o desenvolvimento econômico e social dos indígenas e o desenvolvimento e independência do Brasil", cita a nota.
As "alegações" são "mera fabricação de fake news midiático para instigar a opinião pública contra um empreendimento da mais alta relevância para o país", afirmou a empresa.
"As decisões da Justiça Federal no Amazonas já foram suspensas pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região e a empresa confia que a próxima decisão terá o mesmo destino", disse. "Esperamos o reconhecimento pela Justiça da legalidade das ações adotadas de forma a permitir a implementação de um projeto tão fundamental para a segurança alimentar e o crescimento do Brasil."
Estavam na reunião em uma aldeia do território menos de 200 indígenas, segundo participantes do encontro. Na região, são mais de 12 mil indígenas.
Três dias após a reunião feita, representantes da Potássio do Brasil -o presidente incluído- e lideranças muras foram até o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), para dizer que os muras apoiavam o empreendimento. Lima atua a favor do projeto.
O MPF apontou "manipulações, assédios, cooptações e ameaças" na petição enviada à Justiça Federal, com pedido de suspensão do andamento do licenciamento ambiental.
Em atendimento ao pedido dos procuradores da República, a juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe determinou a suspensão das ações por parte da empresa e aplicou uma multa de R$ 1 milhão à Potássio do Brasil, em razão da "pressão indevida" sobre o povo mura e do comparecimento do presidente da empresa a reuniões internas dos indígenas, o que havia sido vedado pela Justiça.
A juíza também determinou a suspensão do processo de licenciamento conduzido pelo Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas), órgão do governo do estado.
Antes, em setembro, ela já havia determinado a anulação da licença prévia emitida pelo Ipaam para a exploração de potássio e estabelecido que o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) deveria conduzir o licenciamento. Esta decisão foi revertida pelo TRF da 1ª Região, e o MPF recorre.
No governo Jair Bolsonaro (PL), o Ibama refutou por pelo menos três vezes conduzir o processo de licenciamento da exploração de potássio na Amazônia.
https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2023/11/presidente-de-empresa-de-potassio-oferece-compra-de-terra-a-indigenas-por-posicao-favoravel-ouca-audios.shtml
Vinicius Sassine
MANAUS
O presidente da empresa Potássio do Brasil, Adriano Espeschit, prometeu a indígenas muras a compra e entrega de 5.000 hectares de terras em caso de posição favorável em assembleia ao empreendimento de exploração de potássio na região de Autazes (AM), entre os rios Madeira e Amazonas.
A oferta foi seguida de falas de Espeschit contrárias à demarcação do território, apesar do início de procedimentos formais para a delimitação por parte da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), que constituiu um grupo técnico em agosto.
O presidente da Potássio do Brasil, subsidiária do banco canadense Forbes & Manhattan, disse ainda aos muras que o território só poderia virar terra indígena ao fim da retirada do minério, num prazo de 23 a 34 anos. Em nota, a empresa afirma que os benefícios aos muras são públicos.
O potássio é base para fertilizantes utilizados na agricultura em larga escala. O empreendimento em uma região preservada da Amazônia tem apoio no governo Lula (PT). O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), já deu declarações favoráveis ao projeto.
A participação de Espeschit numa assembleia de uma pequena parte dos muras, em 22 de setembro, foi gravada, como consta em manifestação do MPF (Ministério Público Federal) no Amazonas. O áudio de mais de uma hora foi enviado à Procuradoria. O presidente da Potássio do Brasil indicou em sua fala não saber que estava sendo gravado.
No último dia 15, o MPF apontou diversos indícios de cooptação de indígenas e de atropelo a processos internos de consulta, principalmente da aldeia Soares, a mais impactada pelo projeto, com sobreposição de áreas.
Em atendimento a pedido da Procuradoria, a Justiça Federal no Amazonas determinou no dia seguinte a suspensão de "qualquer atitude de coação, manipulação, fraude, intimidação, ameaça, pressão e cooptação" contra muras por parte da Potássio do Brasil.
Ouça abaixo dois trechos das falas de Espeschit:
"Vocês aprovando esse projeto, não pode haver criação de terra indígena", disse o presidente da empresa na reunião gravada. "Porque aprovar e criar uma terra indígena vai inviabilizar do mesmo jeito."
Em seguida, Espeschit fez a promessa da compra de terras. "A gente assumiu o compromisso de comprar uma área dez vezes maior do que a gente vai ocupar em superfície. Estamos assumindo o compromisso de comprar 5.000 hectares, e esses 5.000 hectares estariam disponíveis para programas a partir de hoje, se vocês votarem favorável, do plano Bem Viver Mura."
Ele prometeu ainda empregos, possibilidades de empreender -com prioridade na contratação de empresas de indígenas- e royalties. "Não é terra indígena, é região do povo mura. E o povo mura pode se sentir orgulhoso de estar participando disso."
Segundo o presidente da Potássio do Brasil, o território poderia ser indígena "a partir do momento que acabar a retirada do minério". "O direito de vocês é adquirido. É só uma postergação de tempo. Vai continuar sendo possível, depois que a empresa terminar os 23 anos, ou os 34 anos."
Espeschit disse ainda que a aprovação do empreendimento de exploração de potássio e a demarcação de terra indígena são inconciliáveis. "Se você fizer a aprovação do projeto e solicitar uma terra indígena em cima, você está desaprovando o projeto."
Ele afirmou que "a propriedade de uma terra indígena continua sendo do governo". "A hora que eu colocar a terra dentro do plano Bem Viver Mura, se ela for transferida ao CNPJ de alguma entidade indígena, aí sim é vida, aí sim é propriedade."
O representante da Potássio do Brasil reforçou aos indígenas presentes, que iriam votar em seguida sobre o empreendimento, dois pontos compreendidos como "cruciais": "a não demarcação de terra indígena em cima da área do Soares" e "logicamente a aprovação do projeto".
A Potássio do Brasil, em nota, afirmou que todos os "benefícios sociais e econômicos" previstos para os muras são públicos.
"Transformar mecanismos de proteção social do projeto, amplamente conhecidos, em lances secretos de uma conspiração econômica contra indígenas é uma ação que vai contra a proteção do meio ambiente, a independência e o desenvolvimento econômico e social dos indígenas e o desenvolvimento e independência do Brasil", cita a nota.
As "alegações" são "mera fabricação de fake news midiático para instigar a opinião pública contra um empreendimento da mais alta relevância para o país", afirmou a empresa.
"As decisões da Justiça Federal no Amazonas já foram suspensas pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região e a empresa confia que a próxima decisão terá o mesmo destino", disse. "Esperamos o reconhecimento pela Justiça da legalidade das ações adotadas de forma a permitir a implementação de um projeto tão fundamental para a segurança alimentar e o crescimento do Brasil."
Estavam na reunião em uma aldeia do território menos de 200 indígenas, segundo participantes do encontro. Na região, são mais de 12 mil indígenas.
Três dias após a reunião feita, representantes da Potássio do Brasil -o presidente incluído- e lideranças muras foram até o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), para dizer que os muras apoiavam o empreendimento. Lima atua a favor do projeto.
O MPF apontou "manipulações, assédios, cooptações e ameaças" na petição enviada à Justiça Federal, com pedido de suspensão do andamento do licenciamento ambiental.
Em atendimento ao pedido dos procuradores da República, a juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe determinou a suspensão das ações por parte da empresa e aplicou uma multa de R$ 1 milhão à Potássio do Brasil, em razão da "pressão indevida" sobre o povo mura e do comparecimento do presidente da empresa a reuniões internas dos indígenas, o que havia sido vedado pela Justiça.
A juíza também determinou a suspensão do processo de licenciamento conduzido pelo Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas), órgão do governo do estado.
Antes, em setembro, ela já havia determinado a anulação da licença prévia emitida pelo Ipaam para a exploração de potássio e estabelecido que o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) deveria conduzir o licenciamento. Esta decisão foi revertida pelo TRF da 1ª Região, e o MPF recorre.
No governo Jair Bolsonaro (PL), o Ibama refutou por pelo menos três vezes conduzir o processo de licenciamento da exploração de potássio na Amazônia.
https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2023/11/presidente-de-empresa-de-potassio-oferece-compra-de-terra-a-indigenas-por-posicao-favoravel-ouca-audios.shtml
As notícias publicadas no site Povos Indígenas no Brasil são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos .Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.