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Notícias

Com 17% do território desmatado, Acre pode se tornar o primeiro estado da Amazônia Legal a alcançar o ponto de não-retorno

05/09/2025

Autor: Fábio Pontes

Fonte: Ovaradouro - https://ovaradouro.com.br



A floresta amazônica dentro do estado Acre se encontra perigosamente próximo do ponto de não-retorno - limite em que a vegetação perde a capacidade de se regenerar. Se a devastação continuar nesse ritmo, o estado poderá enfrentar um processo irreversível de savanização, com impactos graves sobre o clima, a produção de alimentos, a disponibilidade de água e a sobrevivência das comunidades locais.

Passados mais de sessenta anos desde o reconhecimento do Acre como uma unidade da federação brasileira - e da consolidação de seu processo de "bovinização" - o estado está muito próximo de alcançar o chamado ponto de não retorno. Ou seja, o limite da área desmatada da Amazônia na qual a floresta perde a sua capacidade de regeneração - levando-nos a viver num ambiente semelhante ao semiárido, com chuvas cada vez mais escassas e elevadas temperaturas.

Até o ano de 2024, o Acre já teve desmatados 17% de toda a sua cobertura florestal. Segundo os estudos científicos, o ponto de não-retorno acontece quando o desmatamento alcança o percentual de 20% de toda a cobertura florestal do território, o que acelera o processo de "desertificação" da floresta tropical. Em resumo, caso o Acre mantenha o seu atual ritmo de devastação do bioma amazônico, em pouco tempo alcançaremos o ponto de não-retorno.

Caso isso aconteça, as condições ambientais podem tornar o estado um território inabitável. A produção de alimentos por meio da agricultura e da pecuária será a atividade mais comprometida. Se hoje muitas comunidades enfrentam o problema da escassez de água nos meses mais críticos do verão, podemos alcançar o colapso completo num futuro não muito distante.

Quando se analisa os dados por município, o cenário é ainda mais crítico. Alguns deles já ultrapassaram o teto do ponto de não-retorno já há algum tempo, incluíndo a capital. Até o ano de 2024, a área de Floresta Amazônica devastada dentro dos limites de Rio Branco chegou a 38,5%; ao longo das últimas seis décadas, já perdemos mais de 340 mil hectares de nossa cobertura florestal.

Entre os 22 municípios acreanos, o cenário mais crítico está em Plácido de Castro, onde o desmatamento já atingiu quase 80% de seu território. Dos 194 mil hectares que compõem os limites de Plácido de Castro, 154 mil já deixaram de ser florestas. Em segundo lugar está Senador Guiomard, com 76% de perda de cobertura florestal, seguido por Acrelândia (74%).

Os dados indicam que os municípios campeões nas taxas de floresta transformada em pasto estão na região leste, no Alto e Baixo Acre, o que inclui ainda Capixaba, Bujari, Porto Acre e Epitaciolândia.

Não por acaso, essa é a região do estado consolidada pelo processo de "bovinização", iniciado a partir da década de 1960. Além da pecuária extensiva, a partir de 2018, o Vale do Acre passou a ser ocupado pela monocultura da soja. Os municípios líderes em taxas de desmatamento estão no cinturão da chamada Zona Amacro - composta por Amazonas, Acre e Rondônia -, a nova fronteira de expansão do agronegócio ao Sul da Amazônia Ocidental.

No primeiro trimestre de 2025, o estado registrou uma área de 17 km2 de floresta desmatada. Em igual período do ano passado foram 6 km2. Já quando se analisa o chamado calendário do desmatamento (de agosto a março), o incremento de floresta derrubada em território acreano foi de 38% quando se compara os dois últimos anos.

"O que ocorre é que essa perda de cobertura florestal no Acre vem se dando sem critérios. A gente não sabe exatamente como e onde está sendo desmatado. A gente começa a se aproximar de um ponto onde a floresta não vai mais conseguir prestar os serviços ambientais, o que gera mais eventos extremos, problemas com relação à temperatura, ao ciclo de chuvas, perda de biodiversidade e problemas de abastecimento de água. E tudo isso é intensificado até chegar o momento em que nós não teremos mais uma floresta", afirmou ao Varadouro, o pesquisador Eufran Amaral, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), no Acre, ex chefe-geral do órgão.

Para Amaral, "o tempo não nos dá mais tempo". Ele defende a urgência de uma estratégia que una a conservação das florestas em pé com a implementação de sistemas agroflorestais produtivos e medicinais.

"Com esse ritmo de desmatamento, a gente vai, progressivamente, empobrecendo a floresta remanescente. E sem a floresta, os serviços ambientais, que são fundamentais, como o sequestro de carbono, polinização, filtragem da água, regulação climática, não mais serão fornecidos pela floresta. Com isso, o clima que hoje já mudou, tende a mudar mais drasticamente. É esse o futuro que nos aguarda", afirma o pesquisador Eufran Amaral, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), no Acre, ex chefe-geral do órgão.

Em seu Relatório Anual de Desmatamento (RAD 2024), o Mapbiomas aponta redução na área de floresta devastada na maior parte dos estados da Amazônia Legal, exceto Acre. Por aqui, houve aumento de 30% de floresta derrubada ao longo do ano passado. Apesar disso, a região conhecida como Amacro - composta por Amazonas, Acre e Rondônia - registrou queda no desmatamento pelo segundo ano consecutivo; diminuição de 13% na comparação com 2023.

O aumento do desmatamento no Acre vem acompanhado da intensificação dos eventos climáticos extremos ao longo dos últimos anos. Secas severas e alagações extremas passaram a ser recorrentes na região. Ondas de calor também impactam a vida da população com temperaturas elevadas.

A temperatura média anual na tríplice fronteira pan-amazônica aumentou 1.8 graus Celsius entre 1990 e 2024. Na prática, a população acreana é afetada com dias muito mais quentes e secos do que no passado. Essa elevação dos termômetros aconteceu em paralelo com o aumento do desmatamento da Floresta Amazônica.

Quando se analisam os modelos meteorológicos para as próximas décadas, a situação é ainda mais assustadora. "Em 34 anos nós tivemos um aumento de temperatura de 1,8 graus. Dentro de uma ou duas décadas, portanto em menos de 30 anos, está previsto para este aumento ser de três graus. Este foi o modelo mais ou menos conservador que identificamos", afirma o ecólogo Irving Foster Brown, da Ufac.

https://ovaradouro.com.br/extincao-a-vista/
 

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