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COP30: debate no estande do MPF expõe expulsão de ribeirinhos para construção da hidrelétrica de Belo Monte

17/11/2025

Fonte: MPF - https://www.mpf.mp.br



"Guardarei para sempre, dentro da minha memória, lembranças do nosso rio e um pouco da nossa história. O rio era a nossa vida, a nossa mãe verdadeira. Antes, com o nosso rio, não existia barreira. Mas depois de Belo Monte, só ficou a bagaceira", recitou o pescador e indígena Leonardo Batista, conhecido como Aranô, durante a discussão "Belo Monte em Debate", realizada no estande do Ministério Público Federal (MPF) na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), em Belém, no Pará.

O debate, realizado no sábado (15), abordou a violência que foi a expulsão das famílias ribeirinhas da região do Rio Xingu para construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, inaugurada em 2016. Participaram da conversa procuradores e procuradoras do MPF, ribeirinhos, professores universitários e pesquisadores. Esse foi o terceiro encontro da discussão "Belo Monte em Debate", no estante do MPF na COP 30. Na semana passada, o primeiro debate expôs o cenário de ecocídio, enquanto o segundo dia focou na falha do "hidrograma de consenso".

Na abertura, a procuradora da República Thaís Santi, que acompanha o caso desde 2014, contextualizou o debate. "A expulsão das famílias do reservatório foi a maior violência da história de Belo Monte", apontou. Segundo ela, essa violência ocorreu porque a usina se instalou no Xingu sem conhecer o que é a vida ribeirinha, a partir da falta de estudos no licenciamento, causando a remoção de milhares de ribeirinhos e o reassentamento em locais urbanos que não correspondiam aos seus costumes.

Ao longo do debate, ribeirinhos relataram a dor de perder seus territórios, lembrando que o rio garantia o sustento das famílias e descrevendo os desafios de reconstruir a vida. Apesar de ter conseguido retornar às margens do reservatório de Belo Monte, dona Raimunda lembrou a remoção violenta de sua casa e contou que ainda enfrenta a falta de condições básicas, o que impede a retomada plena de seu modo de vida. Ela recorreu à música e à poesia como formas de resistência e de preservação da memória ribeirinha.

Busca por protagonismo - O deslocamento forçado, baseado na classificação equivocada de que os ribeirinhos seriam "população urbana pobre", desestruturou práticas essenciais, causando perda de renda, identidade e autonomia. Diante disso, as famílias passaram a reivindicar o reconhecimento como povo tradicional e o direito de voltar ao território. Em 2016, formaram o Conselho dos Ribeirinhos.

Com apoio do MPF, universidades, institutos de pesquisa e movimentos sociais, o conselho mapeou as áreas tradicionalmente ocupadas, registrando locais de moradia, pesca, roça e circulação. O levantamento deu base técnica e social para a reivindicação de um território de retorno. "Esse território é a recomposição de vida das famílias que Belo Monte não matou", frisou a conselheira Francineide dos Santos.

Território Ribeirinho - Como resultado desse processo, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) aprovou, em 2018, o Território Ribeirinho, área destinada a receber as famílias expulsas, permitindo o retorno às margens do Xingu e a retomada de práticas tradicionais como pesca, manejo da terra e deslocamento pelo rio. A implementação desse território é um dos requisitos para a renovação do licenciamento ambiental de Belo Monte, vencido em 2021. "Até hoje, muitos aguardam na cidade, com seus barcos em casa, o retorno para a vida ribeirinha", ressaltou a procuradora.

Mesmo com os avanços, o retorno ainda é lento: apenas 157 famílias, menos da metade das atingidas, voltaram ao território. Quem retornou enfrenta problemas como falta de acesso, água poluída, dificuldade para pescar e restrições para manejar a terra, já que a área está inserida em uma unidade de conservação. A professora universitária Sônia Magalhães explicou que "muitas famílias voltaram, mas não conseguiram ficar, porque não foram oferecidas condições para que elas permanecessem". Apesar disso, destacou que "a resistência ribeirinha explode em vida no território, com as famílias replantando e preservando".

A pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Letícia Brito explicou que o deslocamento compulsório violou direitos humanos e causou a destruição da autonomia alimentar das comunidades. "A volta para o território não pode ser uma medida isolada, precisa ser acompanhada por um conjunto de medidas para garantir a sustentabilidade dessas famílias, para que elas permaneçam", reiterou. A FGV desenvolve um sistema georreferenciado para monitorar o retorno e condições de vida das famílias.

Ao final, a vice-prefeita de Altamira, Thaís Miranda, parabenizou o MPF e o Conselho Ribeirinho pela iniciativa e informou que a prefeitura está emitindo autorizações para que os ribeirinhos possam retornar, plantar e colher. Encerrando os debates, a procuradora reafirmou a importância do diálogo entre MPF e comunidades e disse esperar que as famílias consigam transformar as margens do Xingu em um território ribeirinho florestado, "onde o território é terra, mas também rio e água".

https://www.mpf.mp.br/pgr/noticias-pgr2/2025/cop-30-debate-no-estande-do-mpf-expoe-expulsao-de-ribeirinhos-para-construcao-da-hidreletrica-de-belo-monte
 

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