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Projeto premiado de agrofloresta em aldeia no Acre é replicado em terras indígenas

02/05/2022

Autor: Lucas Altino

Fonte: O Globo - oglobo.globo.com



https://oglobo.globo.com/brasil/meio-ambiente/noticia/2022/05/projeto-premiado-de-agrofloresta-em-aldeia-no-acre-e-replicado-em-terras-indigenas.ghtml

Consórcio Aliança Reflorestar, que exporta experiências de reflorestamento, levou o trabalho feito pelos Ashaninka para a aldeia Nova Esperança

Há 15 anos, os indígenas Ashaninka, situados no Acre, na Aldeia Apiwtxa do Alto Juruá, na fronteira com o Peru, criaram o Centro de Formação Yorenka Ãtame , que significa o "saber da floresta". A iniciativa serviu não só como um centro de formação e difusão de práticas de agrofloresta entre os cerca de 500 moradores, como revitalizou uma área que vinha sendo disputada, e portanto degradada, por madeireiros e fazendeiros vizinhos. Hoje, após o projeto ter recebido diversos prêmios, nacionais e internacionais, ele está sendo expandido. Além de um novo centro, maior, em desenvolvimento na aldeia, a experiência está sendo levada para outras comunidades indígenas, como a aldeia Nova Esperança, da etnia Yawanawá, em um intercâmbio patrocinado pelo consórcio Aliança Reflorestar.

A história do Yorenka Ãtame se entrelaça com a de Benki Ashaninka, liderança local, que chegou a ser secretário municipal de meio ambiente de Marechal Thaumaturgo, mas largou o posto, em 2006, para se dedicar ao centro.

- Criamos um sistema de agrofloresta na nossa comunidade por causa das invasões de fazendeiros e madeireiros que destruíam a floresta. A gente deveria ajudar a natureza e, assim, recompor o que vinha sendo destruído -- explica Benki Ashaninka, que já ganhou prêmios da Unesco, da ONU e de entidades de direitos humanos, por sua promoção da luta pelos territórios indígenas no Brasil.

O Yoranka Ãtame foi montado dentro de uma antiga fazenda, de 80 hectares, tomada por pasto. Hoje, a área está reflorestada, com um misto de espécies frutíferas e de madeiras de lei, o que contribuiu para melhoria da alimentação da população, além de ganhos na preservação ambiental e do equilíbrio no microclima. As espécies cultivadas - cerca de 100 - vão desde açaí, manga, laranja e cupuaçu ao cacau.

-- Nessa pandemia, nós não passamos fome, porque o empreendimento nos deu comida e nos sustentou -- celebra Benki, que destaca sua busca por "ações transformadoras" a partir dos ensinamentos da floresta.

Há pouco mais de dois anos, o trabalho foi expandido no território Ashankina. Se o primeiro projeto teve uma experiência bem sucedida, Benki agora queria criar um instituto, reunindo e democratizando todo o conhecimento adquirido. Foi assim que surgiu o Yorenka Tasorentsi, uma espécie de atualização do projeto de agrofloresta, que envolve ainda escola para os jovens e um plano de gestão para manejo sustentável dos recursos da floresta, numa área muito maior, de 1155 hectares.

-- Eu faço isso desde 1989, aprendi observando a floresta, que já é um sistema completo. Só precisamos adaptá-la de acordo com a necessidade. O Yoranka Ãtame foi incorporada pela comunidade, agora temos um novo instituto -- explica a liderança, que prevê uma inauguração oficial em setembro. -- Precisamos começar pelo trabalho de casa, e proteger o que é nosso.

Intercâmbio entre comunidades

Em janeiro, a experiência dos Ashaninka desembarcou na aldeia Nova Esperança, território Yawanawá, também no Acre, a partir do trabalho do Aliança Reflorestar, um consórcio sem fins lucrativos fundado no ano passado com o objetivo de patrocinar atividades de reflorestamento e de agrofloresta em territórios indígenas e reservas extrativistas. O Aliança reúne as ONGs Instituto Guardiões da Floresta, Instituto Rever, a Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (Opirj) e a Fundação Txai, de Antonio Macedo, ex companheiro de luta de Chico Mendes.

A trajetória de Chico Mendes, por sinal, é uma das inspirações para o Aliança, explica João Fortes, um dos fundadores e coordenadores do consórcio, e que conheceu Mendes em 1987.

-- Chico Mendes implantava o conceito de coletividade dos povos indígenas dentro do processo seringueiro. Ele promovia a cooperação entre comunidades, na preservação das florestas. Agora, fazemos um papel de conector, como foi Chico Mendes no passado -- explica Fortes, que teve a parceria de Ailton Krenak na concepção do projeto.

Dentro desse conceito de redes e conexões, o Aliança objetiva trabalhar sempre em parceria com povos indígenas e comunidades ribeirinhas e extrativistas na valorização da cultura da floresta, com ações a longo prazo e que possam ser estruturadas a partir de conhecimentos e práticas tradicionais de cada comunidade. Assim, o trabalho de reflorestamento prevê também a formação de jovens lideranças, dentro das comunidades, que possam dar continuidade aos ensinamentos ancestrais.

Na aldeia Nova Esperança, está previsto o plantio de 5 mil mudas de árvores frutíferas, como coco, ingá, graviola, e limão, além de espécies pioneiras e de madeira de lei, que ajudam a proteger as frutíferas, por crescerem mais rápido. Nas etapas seguintes do projeto, também serão criados um banco de sementes e um viveiro para plantas. A comunidade Yawanawá ainda receberá treinamento em arborismo para a coleta de sementes no alto das árvores.

O Centro Yorenka Tasorentsi enviou, à aldeia, comitivas para trocas de experiências e para ajudar nas ações. O intercâmbio também envolveu o povo Puyanawa, no fornecimento de mudas e no ensinamento de técnicas de agrofloresta. Após a primeira etapa, em janeiro, quando foram plantadas mais de mil mudas, a nova remessa de sementes está sendo transportada agora, no final de abril. Os custos estão sendo cobertos principalmente pelo patrocínio do Grupo Energisa, e o Aliança Reflorestar segue com suas campanhas de doações.

A previsão é que, após o trabalho no território Yawanawá, o reflorestamento seja feito na área dos Puyanawá, que já detêm a técnica da agrofloresta, mas que deseja agora expandir o trabalho, englobando os povos vizinhos Nukini e Nawa. Depois do Acre, a ideia é seguir a rede até Roraima e chegar na área Ianomâmi.

-- Estamos nesse processo de uma formação de rede de apoio em prol do reflorestamento. Na floresta, se diz que amigo de amigo é um amigo -- diz Fortes, que relembra os ensinamentos que recebeu sobre as melhores formas de interação com os indígenas, com destaque para as rodas de conversa. -- A gente precisa saber ouvir. Nas rodas de conversa, você vai para ouvir, e não para falar, só se houver necessidade. Isso envolve respeito, e também o silêncio. Detalhes que criam confiança no processo.
 

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