De Povos Indígenas no Brasil
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A floresta falou, a Corte Interamericana começou a escutar
05/07/2025
Autor: SURUÍ, Txai
Fonte: FSP - https://www1.folha.uol.com.br/
A floresta falou, a Corte Interamericana começou a escutar
A corte diz juridicamente o que sempre sustentamos: a mudança do clima não é um problema ambiental qualquer
05/07/2025
Txai Suruí
Coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental - Kanindé
No dia 3 de julho de 2025, a Corte Interamericana de Direitos Humanos publicou a Opinião Consultiva no 32 sobre Emergência Climática e Direitos Humanos. A solicitação, apresentada conjuntamente pelo Chile e pela Colômbia em janeiro de 2023, formulou à Corte uma série de perguntas com o objetivo de esclarecer o escopo das obrigações estatais, individuais e coletivas diante da intensificação dos impactos da crise climática, especialmente à luz do direito internacional dos direitos humanos.
Dois anos depois, o resultado é um documento extenso, que reconhece, entre outros pontos, que os países devem proteger o direito a um clima estável como parte do direito a um meio ambiente saudável.
Para nós, povos indígenas, a Corte começa a dizer com palavras jurídicas o que sempre sustentamos com o corpo e o território. A mudança do clima não é um problema ambiental qualquer. Ela atinge as águas, os ciclos, o cotidiano, os espíritos e as pessoas. E os mais afetados não são os que mais causaram o problema. São comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, pescadores e agricultores familiares, que há décadas vêm alertando para o desequilíbrio dos ventos, das chuvas e dos bichos.
Ao reconhecer que os efeitos da emergência climática são desiguais e exigem proteção diferenciada, a Corte afirma que os países têm o dever não apenas de se abster de políticas que agravem nossa vulnerabilidade, mas também de garantir ativamente nossos direitos, incluindo a proteção dos territórios, o respeito à autodeterminação e o reconhecimento dos nossos saberes como parte do direito à ciência.
Significa que nossas formas de conhecer a terra, prever os ciclos, interpretar os sinais do céu não são apenas cultura, mas fundamentos válidos para orientar políticas públicas climáticas. Ao dizer isso, dá um passo importante: reconhece que a justiça climática só será possível se for também justiça para quem cuida do clima.
Esse reconhecimento da Corte é, em verdade, eco de vozes que se fizeram ouvir, muitas vezes à margem das instâncias oficiais, mas que, desta vez, estiveram no centro do processo. As audiências públicas realizadas em Bridgetown, Brasília e Manaus reuniram mais de 200 delegações. Estivemos lá. Fizemos ouvir nossas histórias e realidades. Falamos do que está acontecendo em nossos territórios. Denunciamos os projetos de infraestrutura e mineração que avançam. Dissemos que o desmatamento é também uma violação de direitos humanos.
Ainda assim, a decisão guarda silêncios importantes. A Corte não explicita como a crise climática atual é continuidade de um processo histórico de expropriação, colonialismo e violência. Fala em equidade e cooperação internacional, mas evita tocar na raiz das desigualdades. Sem justiça histórica, toda justiça climática será incompleta.
Essa opinião consultiva é uma conquista coletiva. É uma ferramenta jurídica e política para defender direitos e pressionar os países. Mas não é ponto de chegada. É um passo. Cabe a nós, povos originários e aliados, transformar esse documento em ponte, para que o direito ande ao lado dos rios, das florestas e das vidas que seguem resistindo.
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/txai-surui/2025/07/a-floresta-falou-a-corte-interamericana-comecou-a-escutar.shtml
A corte diz juridicamente o que sempre sustentamos: a mudança do clima não é um problema ambiental qualquer
05/07/2025
Txai Suruí
Coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental - Kanindé
No dia 3 de julho de 2025, a Corte Interamericana de Direitos Humanos publicou a Opinião Consultiva no 32 sobre Emergência Climática e Direitos Humanos. A solicitação, apresentada conjuntamente pelo Chile e pela Colômbia em janeiro de 2023, formulou à Corte uma série de perguntas com o objetivo de esclarecer o escopo das obrigações estatais, individuais e coletivas diante da intensificação dos impactos da crise climática, especialmente à luz do direito internacional dos direitos humanos.
Dois anos depois, o resultado é um documento extenso, que reconhece, entre outros pontos, que os países devem proteger o direito a um clima estável como parte do direito a um meio ambiente saudável.
Para nós, povos indígenas, a Corte começa a dizer com palavras jurídicas o que sempre sustentamos com o corpo e o território. A mudança do clima não é um problema ambiental qualquer. Ela atinge as águas, os ciclos, o cotidiano, os espíritos e as pessoas. E os mais afetados não são os que mais causaram o problema. São comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, pescadores e agricultores familiares, que há décadas vêm alertando para o desequilíbrio dos ventos, das chuvas e dos bichos.
Ao reconhecer que os efeitos da emergência climática são desiguais e exigem proteção diferenciada, a Corte afirma que os países têm o dever não apenas de se abster de políticas que agravem nossa vulnerabilidade, mas também de garantir ativamente nossos direitos, incluindo a proteção dos territórios, o respeito à autodeterminação e o reconhecimento dos nossos saberes como parte do direito à ciência.
Significa que nossas formas de conhecer a terra, prever os ciclos, interpretar os sinais do céu não são apenas cultura, mas fundamentos válidos para orientar políticas públicas climáticas. Ao dizer isso, dá um passo importante: reconhece que a justiça climática só será possível se for também justiça para quem cuida do clima.
Esse reconhecimento da Corte é, em verdade, eco de vozes que se fizeram ouvir, muitas vezes à margem das instâncias oficiais, mas que, desta vez, estiveram no centro do processo. As audiências públicas realizadas em Bridgetown, Brasília e Manaus reuniram mais de 200 delegações. Estivemos lá. Fizemos ouvir nossas histórias e realidades. Falamos do que está acontecendo em nossos territórios. Denunciamos os projetos de infraestrutura e mineração que avançam. Dissemos que o desmatamento é também uma violação de direitos humanos.
Ainda assim, a decisão guarda silêncios importantes. A Corte não explicita como a crise climática atual é continuidade de um processo histórico de expropriação, colonialismo e violência. Fala em equidade e cooperação internacional, mas evita tocar na raiz das desigualdades. Sem justiça histórica, toda justiça climática será incompleta.
Essa opinião consultiva é uma conquista coletiva. É uma ferramenta jurídica e política para defender direitos e pressionar os países. Mas não é ponto de chegada. É um passo. Cabe a nós, povos originários e aliados, transformar esse documento em ponte, para que o direito ande ao lado dos rios, das florestas e das vidas que seguem resistindo.
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/txai-surui/2025/07/a-floresta-falou-a-corte-interamericana-comecou-a-escutar.shtml
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