De Povos Indígenas no Brasil
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Horrores praticados por 'bugreiros' contra povos indígenas não podem ser esquecidos nos 150 anos da imigração italiana no RS
21/05/2025
Autor: Nandi Barrios
Fonte: Brasil de Fato - https://www.brasildefato.com.br/
Horrores praticados por 'bugreiros' contra povos indígenas não podem ser esquecidos nos 150 anos da imigração italiana no RS
Matadores de indígenas foram contratados pelo governo imperial ou por companhias colonizadoras privadas
Ouvindo no radinho de pilha notícias e falas sobre celebrações dos 150 anos da imigração italiana no Rio Grande do Sul, lembrei do que não pode ser esquecido nos eventos das imigrações alemãs e italianas. Estes empreendimentos, ocorridos no século 19 e primeiras décadas do 20, foram patrocinados pelo Império do Brasil e, posteriormente, também pela iniciativa privada. Os alemães começaram a chegar às terras sul-rio-grandense em 1824, ocupando o vale do Rio dos Sinos e encostas da serra, e os italianos em 1875, direcionados para as terras altas e acidentadas da serra.
A historiografia oficial e as empresas de comunicação já dedicaram farta abordagem sobre os contextos europeu decorrentes da Revolução Industrial e das grandes guerras, que motivaram as imigrações de contingentes empobrecidos, trabalhadores desempregados e sem terras, da Europa para América em busca de melhores condições de vida e de prosperidade. Já relataram as dificuldades da travessia atlântica e da chegada aos lotes coloniais com matas densas e de promessas não cumpridas.
Já discorreram sobre os objetivos do Império e da nascente República de povoar o sul do Brasil com europeus, proprietários de minifúndios fornecedores de alimentos, contingente para o Exército e, até admitiram, a intensão de "branqueamento" da população. Por fim, já destacaram e continuam divulgando com fervor a contribuição dos colonos e seus descendentes como trabalhadores persistentes, poupadores, empreendedores, religiosos, formadores de famílias prósperas, que muito concorreram para a construção econômica, sociocultural e étnica do Rio Grande do Sul.
Sem dúvida, tirando o ufanismo, estas abordagens historiográficas e comunicacionais são pertinentes, mas não podemos esquecer dos horrores no mato praticados durante a implantação das colônias. Os imigrantes alemães e italianos chegaram à uma terra habitada com territórios pertencentes a grupos indígenas chamados pelos colonos de "bugres".
Não era um vazio, não era terra de ninguém, menções recorrentes em muitas manifestações, eram terras com matas habitadas notadamente por Kaingang e Xokleng. Para invadir, construir picadas, estradas e ferrovias, ocupar e formar colônias o mato foi "limpo" por matadores de bugres, contratados pelo governo imperial ou por companhias colonizadoras privadas e, até mesmo, por grupos de famílias de imigrantes, que passaram a ser conhecidos como "bugreiros".
Estes compunham grupos, no geral de 15 a 30 homens, que adentravam o mato para caçar e matar indígenas, utilizando armas de fogo, facões e machados. Era comum receberem por bugre morto, assim, cortavam as orelhas dos nativos e colocavam em um arame, formando um colar macabro destinado a comprovar as mortes. Crianças e mulheres sobreviventes eram aprisionadas e levadas para serem adotadas forçadamente por famílias brancas.
Na época e em narrativas posteriores, estas chacinas eram justificadas como ação de proteção a "roubos" de produtos agropecuários, como milho, mandioca, galinhas, porcos e ferramentas (principalmente de metal) e de ataques ("correrias"), com episódios de mortes e raptos (crianças e mulheres) de imigrantes. No entanto, para os Kaingang e Xokleng, que não reconheciam propriedade privada, eram reações às invasões, expropriação de territórios, confinamentos forçados em reservas e massacre de seus povos.
Mas, porque lembrar destes horrores no mato em meio aos festejos dos 150 anos de imigração italiana? Na minha intenção, para sensibilizar e reforçar frente aos descendentes de imigrantes e de todos os cidadãos gaúchos e brasileiros da importância da Memória, Verdade, Reparação e Justiça para os povos indígenas, principalmente o direito à terra.
Para não parecer que é uma quizila de um pelo duro, sugiro pesquisar em aplicativos de busca na internet por trabalhos sobre imigração italiana e/ou no sul do Brasil ou Rio Grande do Sul e bugreiros, vão aparecer trabalhos de pesquisadores/acadêmicos, com sobrenomes de origem italiana e alemã, dedicados ao tema. A maioria dos trabalhos é sobre eventos ocorridos em Santa Catarina, poucos focados no Rio Grande do Sul, o que demonstra a necessidade de pesquisas em fontes com relatos da época, como registros de religiosos, do Exército, policiais, de construção de estradas e ferrovias, das colônias, oralidade indígena e dos imigrantes, entre outras.
* Nandi Barrios é engenheiro florestal, com trabalhos em comunidades indígenas e quilombolas.
**Este é um artigo de opinião e não representa necessariamente a linha editorial do Brasil do Fato.
https://www.brasildefato.com.br/2025/05/21/horrores-praticados-por-bugreiros-contra-povos-indigenas-nao-podem-ser-esquecidos-nos-150-anos-da-imigracao-italiana-no-rs/
Matadores de indígenas foram contratados pelo governo imperial ou por companhias colonizadoras privadas
Ouvindo no radinho de pilha notícias e falas sobre celebrações dos 150 anos da imigração italiana no Rio Grande do Sul, lembrei do que não pode ser esquecido nos eventos das imigrações alemãs e italianas. Estes empreendimentos, ocorridos no século 19 e primeiras décadas do 20, foram patrocinados pelo Império do Brasil e, posteriormente, também pela iniciativa privada. Os alemães começaram a chegar às terras sul-rio-grandense em 1824, ocupando o vale do Rio dos Sinos e encostas da serra, e os italianos em 1875, direcionados para as terras altas e acidentadas da serra.
A historiografia oficial e as empresas de comunicação já dedicaram farta abordagem sobre os contextos europeu decorrentes da Revolução Industrial e das grandes guerras, que motivaram as imigrações de contingentes empobrecidos, trabalhadores desempregados e sem terras, da Europa para América em busca de melhores condições de vida e de prosperidade. Já relataram as dificuldades da travessia atlântica e da chegada aos lotes coloniais com matas densas e de promessas não cumpridas.
Já discorreram sobre os objetivos do Império e da nascente República de povoar o sul do Brasil com europeus, proprietários de minifúndios fornecedores de alimentos, contingente para o Exército e, até admitiram, a intensão de "branqueamento" da população. Por fim, já destacaram e continuam divulgando com fervor a contribuição dos colonos e seus descendentes como trabalhadores persistentes, poupadores, empreendedores, religiosos, formadores de famílias prósperas, que muito concorreram para a construção econômica, sociocultural e étnica do Rio Grande do Sul.
Sem dúvida, tirando o ufanismo, estas abordagens historiográficas e comunicacionais são pertinentes, mas não podemos esquecer dos horrores no mato praticados durante a implantação das colônias. Os imigrantes alemães e italianos chegaram à uma terra habitada com territórios pertencentes a grupos indígenas chamados pelos colonos de "bugres".
Não era um vazio, não era terra de ninguém, menções recorrentes em muitas manifestações, eram terras com matas habitadas notadamente por Kaingang e Xokleng. Para invadir, construir picadas, estradas e ferrovias, ocupar e formar colônias o mato foi "limpo" por matadores de bugres, contratados pelo governo imperial ou por companhias colonizadoras privadas e, até mesmo, por grupos de famílias de imigrantes, que passaram a ser conhecidos como "bugreiros".
Estes compunham grupos, no geral de 15 a 30 homens, que adentravam o mato para caçar e matar indígenas, utilizando armas de fogo, facões e machados. Era comum receberem por bugre morto, assim, cortavam as orelhas dos nativos e colocavam em um arame, formando um colar macabro destinado a comprovar as mortes. Crianças e mulheres sobreviventes eram aprisionadas e levadas para serem adotadas forçadamente por famílias brancas.
Na época e em narrativas posteriores, estas chacinas eram justificadas como ação de proteção a "roubos" de produtos agropecuários, como milho, mandioca, galinhas, porcos e ferramentas (principalmente de metal) e de ataques ("correrias"), com episódios de mortes e raptos (crianças e mulheres) de imigrantes. No entanto, para os Kaingang e Xokleng, que não reconheciam propriedade privada, eram reações às invasões, expropriação de territórios, confinamentos forçados em reservas e massacre de seus povos.
Mas, porque lembrar destes horrores no mato em meio aos festejos dos 150 anos de imigração italiana? Na minha intenção, para sensibilizar e reforçar frente aos descendentes de imigrantes e de todos os cidadãos gaúchos e brasileiros da importância da Memória, Verdade, Reparação e Justiça para os povos indígenas, principalmente o direito à terra.
Para não parecer que é uma quizila de um pelo duro, sugiro pesquisar em aplicativos de busca na internet por trabalhos sobre imigração italiana e/ou no sul do Brasil ou Rio Grande do Sul e bugreiros, vão aparecer trabalhos de pesquisadores/acadêmicos, com sobrenomes de origem italiana e alemã, dedicados ao tema. A maioria dos trabalhos é sobre eventos ocorridos em Santa Catarina, poucos focados no Rio Grande do Sul, o que demonstra a necessidade de pesquisas em fontes com relatos da época, como registros de religiosos, do Exército, policiais, de construção de estradas e ferrovias, das colônias, oralidade indígena e dos imigrantes, entre outras.
* Nandi Barrios é engenheiro florestal, com trabalhos em comunidades indígenas e quilombolas.
**Este é um artigo de opinião e não representa necessariamente a linha editorial do Brasil do Fato.
https://www.brasildefato.com.br/2025/05/21/horrores-praticados-por-bugreiros-contra-povos-indigenas-nao-podem-ser-esquecidos-nos-150-anos-da-imigracao-italiana-no-rs/
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